A imprensa brasileira tem revelado incapacidade para acompanhar adequadamente a economia brasileira. Só dá destaque às relações do setor produtivo com o governo, não penetrando no universo da macroeconomia empresarial, o que significa desinformar o cidadão, atingido diariamente por decisões controversas no mundo dos negócios.
Mesmo um jornal especializado em economia, como o Valor, publicado pelo grupo Globo, faz uma matéria tão burocrática, superficial e confusa sobre a divulgação, na semana passada, dos resultados, no terceiro trimestre deste ano, da Vale, a maior mineradora do país. É também uma das maiores do mundo e, individualmente, a que mais exporta, responsável pelo segundo mais rentável produto do comércio exterior brasileiro, o minério de ferro. Não é pouca coisa, naturalmente. Interessa a centenas de milhares de pessoas, os empregados da companhia, os terceirizados e os acionistas.
Em um cálculo anual, trata-se de empresa com receita líquida de 52 bilhões de reais e lucro líquido que, mesmo com redução de 40,46% em base anual, ainda alcançou quase 14 bilhões de reais, enquanto o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização, aumentou 6%, indo para R$ 20,45 bilhões.
A metodologia adotada pelo jornal no enunciado dos dados mais complica do que facilita a sua compreensão. Não aplica o mesmo padrão de estatísticas trimestrais e anuais a todos os números apresentados, desviando o leitor da conclusão que um exame mais acurado revelaria: operacionalmente a Vale vai bem, mas financeiramente não.
Para cativar pequenos e médios acionistas e remunerar os sócios, a empresa desvia recursos operacionais e alarga o perfil da sua dívida. Valor engole a estratégia da empresa de projetar a meta de dívida líquida expandida num parâmetro amplo demais, entre 10 bilhões e 20 bilhões de dólares, equivalente, no limite extremo, a dois faturamentos líquidos anuais inteiros.
Escondida na matéria está uma informação que interessa aos paraenses: o preço médio de referência de minério de ferro foi 10% mais alto, permitindo agregar mais US$ 174 milhões ao faturamento. Principalmente por causa do minério mais puro de Carajás, a maior mina a céu aberto do planeta, no Pará.
O anúncio trimestral do balanço da Vale tem repercussão imediata no “mercado”. Imediatamente em seguida à divulgação dos números, com a bolsa de valores ainda em atividade, no dia 26, as negociações dos papéis foram interrompidas por 20 minutos para a análise dos dados. Quando as atividades foram retomadas, as ações da mineradora fecharam o dia em alta de mais de 2%.
A matéria do Valor não noticiou que a Vale distribuirá 10,6 bilhões de reais (o equivalente a 2,15 bilhões de dólares) em dividendos extraordinários e juros sobre capital próprio. A empresa também criará um novo programa de recompra de ações ordinárias.
Ou seja: a antiga estatal dará prosseguimento ao seu processo de consolidação como multinacional, concentrará as decisões entre seus sócios e continuará a atrair milhares de compradores de ações, pulverizados pelo mundo, distribuindo mais dividendos. Cada vez mais uma mineradora com visão financeira.
A imagem que ilustra este artigo mostra um anúncio da Vale em painel de led da Bolsa de Valores de Nova Iorque na Times Square (Foto: Agência Vale).
Além de colaborar com a agência Amazônia Real, Lúcio Flávio Pinto mantém quatro blogs, que podem ser consultados gratuitamente nos seguintes endereços:
* lucioflaviopinto.wordpress.com – acompanhamento sintonizado no dia a dia.
* valeqvale.wordpress.com – inteiramente dedicado à maior mineradora do país, dona de Carajás, a maior província mineral do mundo.
* amazoniahj.wordpress.com – uma enciclopédia da Amazônia contemporânea, já com centenas de verbetes, num banco de dados único, sem igual.
* cabanagem180.wordpress.com – documentos e análises sobre a maior rebelião popular da história do Brasil.
As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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