“Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos”. Os versos do poeta João Cabral de Melo Neto (1920-1999) poderiam ilustrar a missão do Centro Integrado da Sociobiodiversidade Amazônica (Cisam), liderado pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e com parceria de outras doze universidades federais sediadas na região.
De acordo com a base de dados Web of Science, a UFPA lidera a produção científica sobre e na Amazônia. As demais universidades públicas amazônicas contam igualmente com expressiva produção científica sobre a realidade local, o que garante um elenco de instituições aptas a contribuir com ciência para o conhecimento e desenvolvimento da região.
No entanto, o cenário é crítico em matéria de financiamento para a pesquisa. Conforme estudo publicado na revista Perpective in Ecology and Conservation em 2024, co-assinado pelo professor Leandro Juen (UFPA), doutor em Ecologia e Evolução, a Amazônia é a região brasileira que menos recebe recursos para pesquisas em biodiversidade.
Dentro do bioma, as desigualdades acentuam-se, pois os grandes centros urbanos concentram mais investimentos. Para transformar diretamente a forma como a pesquisa, o ensino e a extensão são conduzidos na região, considerando o ecossistema no todo e em sua complexidade, é preciso somar esforços.
Neste sentido, o Cisam inova ao reunir 13 instituições federais amazônicas em torno de uma ampla finalidade: fortalecer suas atividades de pesquisa, ensino e extensão, a partir de oito áreas temáticas: Biodiversidade e Conservação; Monitoramento de Água, Floresta, Solo e Clima; Monitoramento do Oceano e da Foz do Amazonas; Contaminação Ambiental e Saúde do Amazônida; Povos e Populações da Amazônia; Cidades Vilas e Territórios Amazônicos; Dinâmicas Socioeconômicas Territoriais e Fundiárias na Amazônia; Inovação, Socio-Bioeconomia e Desenvolvimento Sustentável.
“A comunicação entre áreas de conhecimento diversas favorece a articulação de processos que seguem diferentes ritmos (geológico, climatológico, biológico, social etc.) e escalas (local, regional e/ou global), resgatando temas que já são tradicionalmente investigados, porém alcançando as circunstâncias cotidianas da vida na região”, explica Juen, coordenador geral do Cisam.
Igualmente, o Centro objetiva o compartilhamento de recursos, a formação de equipes interdisciplinares e multi-institucionais, o intercâmbio de pesquisadores, professores e estudantes, o compartilhamento de infraestrutura laboratorial e equipamentos, a organização e realização de eventos, além da otimização de recursos e a participação ativa e per manente da sociedade amazônida como protagonista e responsável pelo desenvolvimento sustentável da região. Unem-se à UFPA na composição do Cisam as Universidades Federais do Acre (UFAC), do Amapá (UNIFAP), do Amazonas (UFAM), do Maranhão (UFMA), do Mato Grosso (UFMT), do Norte do Tocantins (UFNT), do Oeste do Pará (UFOPA), de Rondônia (UNIR), de Roraima (UFRR), do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA), do Tocantins (UFT) e Rural da Amazônia (UFRA).
A consolidação de várias redes de pesquisa na Amazônia é um diferencial do Centro Integrado da Sociobiodiversidade Amazônica, uma vez que permite o protagonismo e a liderança ativa das instituições e pessoas amazônidas. “Alinhados aos princípios da ciência cidadã, o Cisam busca compreender a realidade dos amazônidas e do bioma, e não apenas tratá-los como objetos de estudo. Isso implica uma abordagem ‘de dentro para fora’, com as universidades federais e os grupos de pesquisa da Amazônia liderando os projetos em parceria com instituições e grupos externos à Amazônia”, comenta Juen.
A união dessas universidades pode produzir avanços significativos na esfera do desenvolvimento sustentável, pois um ambiente de inovação e de formação de recursos humanos altamente qualificados mostra-se mais atrativo a investimentos. Segundo o reitor da UFPA, Emmanuel Zagury Tourinho, “o Cisam é integrado em vários sentidos: ele integra o esforço em pesquisa, extensão e formação de 13 universidades públicas sediadas na região; ele integra a academia a setores não acadêmicos que discutem a realidade das populações amazônicas; ele integra contribuições de diferentes áreas de conhecimento, buscando apreender a complexidade dos problemas regionais em um ambiente de diálogo interdisciplinar; e ele integra a produção de conhecimento ao esforço para colocá-lo à disposição das populações locais. Por isso, com o Cisam, nossas universidades poderão fazer mais e com maior impacto na sociedade”.
Espera-se que as informações científicas produzidas pelos grupos de pesquisa nas oito áreas temáticas possibilitem a elaboração de diagnósticos periódicos para responder às demandas da sociedade, assim como sirvam de base para a formulação de políticas públicas. Da mesma forma, idealiza-se a implementação do Museu das Amazônias (MAS), compreendendo acervos sobre biodiversidade e diversidade sociocultural dos povos originários e tradicionais amazônidas.
De maneira concreta, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Sínteses da Biodiversidade Amazônia (INCT SinBiAm), sediado na UFPA, traduz os objetivos do Cisam, dado que seus trabalhos têm contribuição de mais de 32 instituições (destas, 15 são da Amazônia), bem como integram dados em larga escala, aprimorando a capacidade de síntese da biodiversidade amazônica, promovendo a conservação da sociobiodiversidade com dados atualizados, permitindo que instituições e tomadores de decisões possam definir políticas públicas e ambientais na região.
O Instituto Amazônico do Mercúrio (IAMER), recém criado, é também um bom exemplo do trabalho que vem sendo estruturado no âmbito do Cisam. Coordenado pela professora Elena Crespo, da UFPA, o IAMER conta também com pesquisadores da UFOPA, UNIFAP e UNIR , além de pesquisadores da Universidade do Estado do Amazonas e Universidade do Gurupi, no Tocantins, para a pesquisa sobre a contaminação por mercúrio na região e ações com as populações atingidas.
O Cisam é uma iniciativa instalada e liderada por instituições na Amazônia, em colaboração com instituições e grupos de pesquisa brasileiros e estrangeiros. Várias parcerias já estão em andamento ou sendo construídas para esse fim, como o convênio de cooperação firmado em abril passado entre a Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade de São Paulo (USP), por meio do Centro de Estudos da Amazônia Sustentável (CEAS/USP).
O instrumento permite o desenvolvimento de projetos de pesquisa em parceria na Amazônia, com atribuições compartilhadas na liderança intelectual e gestão de recursos. “Contar com parcerias que venham para somar e que reconhecem a capacidade já instalada na Amazônia pelas intuições sediadas no bioma é muito importante”, avalia Juen.
Segundo o reitor Emmanuel Tourinho, “os grupos de pesquisa amazônicos têm uma familiaridade única com a realidade regional, mas não desejam e não podem dar conta dos desafios científicos da Amazônia atuando de modo isolado. Valorizamos muito o trabalho colaborativo com instituições brasileiras e estrangeiras que reconhecem a importância e capacidade científica de nossas universidades. Este novo momento da cooperação entre UFPA e USP ilustra esse cenário positivo e nos abre um horizonte para muitas realizações conjuntas importantes”.
Lista de atuação do Cisam:
- Biodiversidade e Conservação
- Monitoramento de Água, Floresta, Solo e Clima
- Monitoramento do Oceano e da Foz do Amazonas
- Contaminação Ambiental e Saúde do Amazônida
- Povos e Populações da Amazônia
- Cidades Vilas e Territórios Amazônicos
- Dinâmicas Socioeconômicas Territoriais e Fundiárias na Amazônia
- Inovação, Bioeconomia e Desenvolvimento Sustentável
*O conteúdo foi originalmente publicado pelo Jornal Beira do Rio, da UFPA, edição 171, escrito por Thays Braga
As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Portal Amazônia e são de total responsabilidade do autor.
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