Belém (PA) – No discurso de abertura da Cúpula do Clima, em Belém, nesta quinta-feira (06), o presidente Luís Inácio Lula da Silva abordou a necessidade de o mundo “superar a dependência dos combustíveis fósseis”. Esse é um dos temas mais espinhosos da COP 30 porque muitos países que têm no petróleo, carvão e gás as âncoras de suas economias resistem a incluir o assunto na agenda climática. Os combustíveis fósseis são responsáveis por 70% das emissões de gases do efeito estufa, que aumentam a temperatura média do planeta e provocam desastres como secas extremas e inundações.
O próprio Lula destacou que foram necessárias 28 conferências para que, em Dubai, o assunto começasse a ser discutido. Lula afirmou: “Estou convencido de que, apesar das nossas dificuldades e contradições, precisamos de mapas do caminho para, de forma justa e planejada, reverter o desmatamento, superar a dependência dos combustíveis fósseis e mobilizar os recursos necessários para esses objetivos.”
A menção de Lula à necessidade de superar a “dependência dos combustíveis fósseis” foi uma vitória da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, no embate interno entre diferentes setores do governo, segundo a apuração da Amazônia Real com uma fonte próxima à ministra. No governo, há um setor claramente defensor da exploração de petróleo como motor do desenvolvimento do país.
O próprio Lula se referiu a “contradições” no processo de afastamento dos combustíveis fósseis, expressão que cai como uma luva ao seu governo e também às dificuldades dentro das conferências climáticas. Há cerca de vinte dias, o Ibama concedeu licença para a Petrobras perfurar um poço de pesquisa exploratória na Bacia da Foz do Amazonas, dentro da região conhecida como Margem Equatorial. A pesquisa permitirá a avaliação do potencial econômico da bacia e é vista por muitos cientistas e ambientalistas como um caminho sem volta em mais uma frente de exploração e de emissão de gases do efeito estufa.


Luene Karipuna, liderança e comunicadora indígena (Foto: Marizilda Cruppe/ Greenpeace/2024) e Imagem aérea da margem equatorial e foz do rio Amazonas (Foto: Suboficial (ES) Menezes/ Marinha do Brasil).
A liderança indígena do Amapá, Luene Karipuna, criticou o discurso do presidente. “A Amazônia tem sido leiloada por ele. Ele cobra de outros países, mas ele está abrindo uma nova fronteira de exploração de petróleo no Brasil numa área muito sensível. A gente tem visto os leilões de poços de petróleo sendo feitos e a liberação para pesquisa, agora, na costa do Amapá. Quem quer liderar a eliminação do uso dos combustíveis fósseis, precisa começar no nosso país. Nós temos que ser exemplo não só nos discursos bonitos. Nós precisamos de ações concretas”, avaliou.
Luene Karipuna se queixou da falta de consulta aos povos indígenas. “Não se considera a vida dos povos indígenas, não somos considerados no processo. Já estamos sentindo os impactos sociais e econômicos nas proximidades do nosso território. Por mais que a gente tenha áreas de proteção, explorar petróleo na Amazônia contribui para acelerar a crise climática no mundo. O bloco 59 é a porta de entrada para exploração de toda a Margem Equatorial e da Amazônia.”
No final de outubro, Lula apresentou outro tom sobre o assunto da exploração do petróleo, ao defender a autorização de pesquisa na Foz do Amazonas. “Foi dada a licença do Ibama para que o Ibama comece a fazer pesquisa. Eu tenho dito que não é possível ninguém abrir mão do combustível fóssil de um dia para noite. É preciso construir o fim da utilização do combustível fóssil. E para isso a gente tem que pesquisar a Margem Equatorial”.
Sinalização positiva

O secretário-executivo da rede Observatório do Clima, Márcio Astrini, concorda que é preciso um “mapa do caminho” para acabar com o uso de combustíveis fósseis, mas que é preciso transformar o discurso em ação. “É exatamente do que precisamos e é exatamente o que esperamos que a presidência da conferência coloque como proposta sobre a mesa. O sucesso da COP30 se dará ao transformar as palavras do presidente brasileiro em resolução final.”
O Observatório do Clima também divulgou em nota que a posição manifestada por Lula “fornece o impulso político necessário para o assunto poder vir à mesa em Belém”. O Observatório do Clima destaca que havia dúvidas sobre se o presidente se manifestaria dessa forma “dados os interesses petroleiros de áreas importantes do governo”.
Outra dificuldade para incluir a redução dos combustíveis fósseis na agenda das COPs é que países como Arábia Saudita e Índia “têm se oposto veementemente a qualquer menção a eles em qualquer negociação de clima, e conseguiram eliminá-la da declaração de líderes do G20 e da Cúpula do Futuro, no ano passado”, ressaltou a rede, formada por várias organizações da sociedade civil.

Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) recebeu a fala do presidente Lula como uma “sinalização positiva e demonstra que o país tem capacidade de liderar avanços na COP 30 nessa agenda”. Ela destacou que o Brasil já tem dado passos importantes na revisão dos subsídios aos combustíveis fósseis. “Os subsídios ao consumo caíram em 2024 com a retomada da cobrança de PIS e Cofins sobre gasolina e óleo diesel”, exemplificou.
A Cúpula do Clima de chefes de estado e de governo funciona como uma bússola para as delegações da COP 30 que vão se reunir de 10 a 21 de novembro no Parque da Cidade. Lula também mencionou a necessidade de reduzir o desmatamento e de ampliar o financiamento climático, com a transição para formas de energia sustentáveis e ações de proteção ambiental.
Sobre o financiamento, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, e a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, anunciaram que o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), lançado oficialmente no primeiro dia da Cúpula do Clima, recebeu o compromisso de aportes que somam cerca de U$ 5,5 bilhões de dólares. O Brasil foi o primeiro a anunciar o investimento de U$ 1 bilhão. Agora, a Noruega anunciou U$ 3 bilhões; a Indonésia, U$ 1 bilhão e a França, 500 milhões de euros.
O fundo é um mecanismo proposto pelo Brasil que pretende combinar recursos públicos e de investidores privados para proteger florestas tropicais por meio de pagamentos por serviços ambientais. Segundo Haddad, 73 países com florestas tropicais poderão se beneficiar dos recursos que podem alcançar o montante de U$ 125 bilhões (públicos e privados). Não há prazo definido para que essa soma de recursos seja alcançada. A ministra Sônia Guajajara disse que o fundo prevê a garantia de que 20% dos recursos serão para apoio direto às comunidades indígenas e comunidades tradicionais, mas que as formas de repasse ainda serão definidas.
As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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