Um grave acidente, ocorrido no Acampamento Terra e Liberdade, do MST, durante o serviço de instalação de internet, fez 9 vítimas, sendo 6 trabalhadores rurais e 3 funcionários da empresa G5 Telecom (Foto cedida por Ícaro Matos).
Os governos federal e estadual do Pará decidiram reagir só após a tragédia que deixou 9 mortos em um acampamento do Movimento Sem Terra (MST) em Parauapebas, na noite do último sábado (9). Representantes oficiais foram enviados ao sul do Estado entre domingo e segunda-feira para prestar algum auxílio ou averiguar o processo da questão fundiária na região.
Uma explosão, provocada por um curto-circuito na rede elétrica, resultou em um incêndio que se alastrou por duas barracas do Acampamento Terra e Liberdade. Seis trabalhadores rurais e três funcionários da empresa G5 Internet Telecom, que moravam no Assentamento 17 de abril, em Eldorado do Carajás, não conseguiram escapar do grave acidente. A instalação do serviço de internet atenderia às necessidades de comunicação dos trabalhadores rurais.
No domingo, segundo informações da coordenação do MST paraense, o secretário Giovanni Corrêa Queiroz (Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca) viajou para o local da tragédia em companhia de membros da Secretaria de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda (Seaster) e da Defesa Civil.
Na manhã de segunda-feira (11), foram realizados um ato em defesa da reforma agrária e uma reunião que contou com a presença do ministro Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), e do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), César Aldrighi. Em nota oficial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prestou solidariedade aos familiares e técnicos que estavam no acampamento, durante a tragédia, e afirmou: “Estamos trabalhando para avançar na retomada da reforma agrária, com a identificação de terra públicas disponíveis, para, após anos de paralisação, dar oportunidade de trabalho e produção para famílias do campo”.
O coordenador do Pará do MST, Jorge Neri, não escondeu sua indignação com a reação tardia. “Com certeza uma tragédia dessa não aconteceria se as pessoas tivessem na terra, se estivessem trabalhando na terra. Acampamento não é o melhor lugar para estar. Se tivesse terra para todo mundo nesse país, se tivesse reforma agrária, as pessoas não teriam que ficar sujeitas a qualquer tipo de incidente ou tragédia”, desabafou.
Embora previsto, o sepultamento coletivo acabou não ocorrendo por decisão das famílias, que preferiram realizar cerimônias privadas. Flores vermelhas e canções de luta marcaram a despedida das vítimas. Até a tarde desta segunda-feira, o Instituto Médico Legal (IML) de Parauapebas já tinha liberado sete corpos para sepultamento. Um corpo ainda está em processo de identificação.
“Imagem de destruição”
Uma assembleia geral no domingo contou com a participação de várias lideranças do MST, incluindo o dirigente nacional João Paulo Rodrigues. “A noite do dia 9 de dezembro de 2023 ficará marcada na memória de centenas de pessoas acampadas, que nutrem a esperança e o sonho de conquistar um pedaço de terra para produzir alimentos, ter uma moradia e dignidade para viver. Mas diante da irresponsabilidade da empresa de internet G5 Telecom, 9 pessoas tiveram seus sonhos interrompidos. A imagem da destruição é a que fica neste domingo (10), que estava destinado para ser o Dia da Família no Acampamento Terra e Liberdade”, informou a nota da coordenação estadual do MST no Pará. Além das 9 mortes, 8 pessoas ficaram feridas. Outros sete acampados já haviam tido alta na noite de sábado. Uma pessoa permanece internada, com queimaduras de segundo grau, porém, com quadro de saúde estável.
Neri pediu também solidariedade para as mais de mil famílias do acampamento Terra e Liberdade, que somam quase 2.500 pessoas, incluindo crianças, mulheres e homens. Entre as perdas de vidas e feridos, também ocorreu prejuízo material, como a queima de aparelhos eletrodomésticos. Pelo menos dois barracões, feitos de lona e palha, foram consumidos pelo fogo, ocasionado pela explosão na rede elétrica.
“O estado de vulnerabilidade do acampamento Terra e Liberdade, que luta pela garantia da terra e do trabalho no campo, a partir de uma ocupação dentro de um latifúndio histórico na região paraense, precisa chamar a atenção da sociedade e do poder público”, afirmou a coordenadora do MST no Pará, Beatriz Luz. “As famílias, hoje, estão em um acampamento provisório devido a intimidação da ocupação do latifúndio.” Ela disse ainda que o acampamento estava em clima de tensão pelo fato de a Polícia Militar do Pará estar fazendo a segurança privada do fazendeiro José Miranda Cruz, proprietário das fazendas Santa Maria e Três Marias, que ficam na área do acampamento.
Em nota à Amazônia Real, a Secretaria de Comunicação do Pará afirmou que a Polícia Militar não faz segurança de propriedade privada e que, portanto, “a informação (da líder do MST) não procede”. A nota informou ainda que as equipes da PM e do Corpo de Bombeiros foram as primeiras a prestar atendimento às vítimas do incêndio.
Empresa se limita em lançar nota de pesar
A G5 Telecom estava instalando pontos de internet no acampamento, quando a antena se chocou com a rede de alta-tensão de energia. A descarga elétrica logo virou um incêndio que se propagou pela própria rede de eletricidade das precárias moradias dentro do acampamento.
Nas redes sociais, a empresa G5 Telecom lamentou o falecimento dos seus três funcionários e afirmou que “segue dando apoio e auxílio aos familiares dos colaboradores”. A nota se estende dando “condolências a todos que perderam seus familiares e amigos no incêndio ocorrido no acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST”, porém, não fala de apoio aos acampados. A reportagem tentou contato com a empresa, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
Vítimas do acampamento Terra e Liberdade:
Jovenilson Aragão Trindade
Francisco Ferreira
Francisco De Assis Pereira Rodrigues
Fernanda Sousa de Almeida
Eva Maria da Conceição Silva
Uma pessoa ainda não identificada
Funcionários da G5 Internet:
Gabriel Pereira da Silva
Geovane Pereira dos Santos
Francisco do Nascimento Sousa Júnior
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