Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
Censo 2022: analfabetismo atinge 11,4 milhões de brasileiros

Censo 2022: analfabetismo atinge 11,4 milhões de brasileiros

Um milhão deles vivem na região Norte, onde está localizada a cidade com pior taxa de analfabetismo do Brasil, Alto Alegre, em Roraima; lá, quase 40% da população não sabe ler ou escrever. Na imagem acima, alunos da Escola Estadual Indígena Tobias Barreto, Região Amajari em Roraima (Foto: Wei Tenente)


O Brasil tem 11,4 milhões de analfabetos, e 1 milhão deles moram na região Norte. Alto Alegre, em Roraima, é o município brasileiro com a maior taxa de analfabetismo, de 36,8%. Esse índice é 40 vezes maior (na verdade, pior) que São João do Oeste, em Santa Catarina, onde a quase totalidade de sua população é alfabetizada. Por que e como o País ainda enfrenta esse grave problema educacional é algo que o Censo 2022 começa a explicar.

A pior taxa de alfabetização fica no Nordeste: 85,8% de sua população sabe ler e escrever. No Brasil, esse índice é de 93,0%. A região do Norte está na segunda pior colocação, com 91,8%, portanto atrás do País. Atualmente, apenas Acre (87,9%), Tocantins (90,9%) e Pará (91,2%) estão abaixo da média brasileira. Amazonas e Roraima (93,1%), Amapá (93,5%) e Rondônia (93,6%) têm mais pessoas alfabetizadas do que a média nacional. Mas essa distribuição não é igualitária por diferentes recortes.

Por trás desses números está o tamanho da desigualdade estrutural brasileira. O analfabetismo é um problema que custa a ser solucionado no Brasil, embora deva-se reconhecer que, lentamente, ele está melhorando. Em 1940, apenas 44 a cada 100 brasileiros sabiam ler e escrever. Hoje, são 93 a cada 100 brasileiros. A cada Censo, o País reduz o número de analfabetos. Na vida real, isso significa que praticamente quase todos os jovens estão alfabetizados, o que não ocorre com os mais velhos.

O Censo 2022 levantou que 68,5% da população brasileira vive em 3.564 municípios cuja taxa de alfabetização das pessoas de 15 anos ou mais era menor do que a média nacional (93%). No levantamento de 2010, 75,4% viviam em 4.501 cidades cuja taxa de alfabetização eram os mesmos 93%.

Segundo o IBGE, Norte e Nordeste melhoraram as suas taxas de alfabetização, mas ainda convivem com o fantasma do analfabetismo entre os jovens. Nessas duas regiões, entre 2,2% e 2,4% dos jovens de 15 a 19 anos não sabem ler um bilhete simples ou uma lista de compras. É justamente nessa faixa etária que está a menor taxa de analfabetismo no Brasil. Nas regiões Sul e Sudeste, essa incapacidade de leitura só se verifica na faixa de adultos de 45 a 54 anos, que abandonaram e nunca mais voltaram à escola.

“A taxa da alfabetização não muda rapidamente, é um estoque da realidade”, diz Betina Fresneda, da equipe técnica responsável pela temática da educação no IBGE. Pelo Censo 2022, a proporção de idosos que não sabem ler é 10 vezes maior que a de jovens de 15 a 19 anos dentro da população que se declara branca. Porém, entre pretos e pardos de 65 anos ou mais, essa proporção é 18 vezes maior na comparação com a juventude. Ou seja, o analfabetismo é uma questão etária, mas também racial. 

Brancos têm taxa de analfabetismo de 4,3%, enquanto a dos pretos é 2,3 vezes maior e a dos pardos, o dobro. A cada dez analfabetos no Nordeste, oito são pretos ou pardos. Já se essa comparação de brancos for feita com os indígenas é quase o quádruplo. No Censo 2022, foi constatado que o analfabetismo atinge 16,1% dos povos originários. As políticas públicas para melhorar a educação indígena evidenciam uma melhora visível, mas ainda incapazes de oferecer efetivamente uma solução para essa realidade.

A realidade indígena

Indígenas durante o desfile de 7 de setembro em Alto Alegre, RR (Foto: Prefeitura de Alto Alegre).

Os resultados do Censo 2022 apontam que há 1.187.246 indígenas acima dos 15 anos, sendo que 1.008.539 deles sabiam ler e escrever um bilhete simples. Esse contingente equivale a 85% da população alfabetizada, ainda oito pontos percentuais abaixo da média nacional. A taxa de analfabetismo entre indígenas é o dobro da população brasileira em geral. Mas foi na região Norte que esse índice mais caiu entre os últimos levantamentos do IBGE. Passou de 31,3% em 2010 para 15,1% dois anos atrás.

Professora da rede estadual há mais de 25 anos, Márcia Mura conhece bem essa realidade. Atuando em escolas indígenas ou de comunidades ribeirinhas em Rondônia, o que ela percebia era que não basta apenas ensinar uma criança a ler e escrever bilhetes simples. A educadora cansou de se deparar com alunos da 6ª série com deficiências de leitura e escrita. Para ela, falta investimento para trabalhar a educação específica e diferenciada.  

“São outros contextos e outras formas de ver o mundo. A partir do momento que se impõe uma educação que não funciona nem nas escolas não-indígenas, muito menos vai dar certo nas escolas de contexto ribeirinho ou indígenas”, afirma.

Márcia Mura (Foto: Leandro Marques).

Nas várias instituições de ensino em que já deu aula, para estudantes indígenas e ribeirinhos, Márcia Mura tem percebido que espaços antes valorizados, como a biblioteca, estão perdendo espaço. Em vez de livros, os alunos pesquisam no Google. “O analfabetismo não é só a questão de ler e escrever, mas tem também o analfabetismo político, que é muito grande.” No Baixo Madeira, logo após o doutorado, ela trabalhou como voluntária tentando implementar a chamada educação de afirmação indígena, onde o ensino é feito a partir da sua realidade. A ideia era aproximar os saberes ancestrais, os elementos que fazem parte da vida das comunidades, numa tentativa de reter o conhecimento. Ouviu de colegas professores e coordenadores de colégios que aquele tipo de conteúdo não servia aos alunos, porque “não caía no Enem”.

A cidade de Alto Alegre (RR), que detém a marca de pior taxa de analfabetismo do Brasil, acaba de receber a boa notícia de que poderá contar, junto de Amajari, Cantá, Bonfim, a zona rural de Boa Vista, Pacaraima e Normandia, com alguns dos 19 novos professores indígenas aprovados em concurso público iniciado em março de 2022. Roraima possui 251 escolas estaduais indígenas e 18.820 estudantes matriculados, contando com mais de 2 mil professores, sendo 740 indígenas. Mas como crer que as coisas vão melhorar em um Estado pró-mineração, que meninos trocam a escola pelo garimpo?

“Fico muito feliz de estar levando professores indígenas formados para as comunidades do Estado e que vão trabalhar para dar uma educação de melhor qualidade. É importante lembrar que o governo de Roraima valoriza todas as tradições, cultura e autodeterminação dos povos indígenas”, disse o governador Antonio Denarium (PP), registrado em um texto da Assessoria de Imprensa. Denarium foi reeleito em primeiro turno nas últimas eleições com forte apoio dos garimpeiros, os mesmos que invadem ilegalmente o Território Indígena Yanomami há anos. Até sua irmã já foi alvo de operação da Polícia Federal que investiga a lavagem de dinheiro no Estado, fruto do comércio ilegal do garimpo na terra dos Yanomami.

Em junho do ano passado, o IBGE já havia divulgado a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua: Educação 2022, em que mostrava que a taxa de analfabetismo havia recuado de 6,1% em 2019 para 5,6% dois anos atrás. O número conflita com os 7% detectados no Censo 2022, que colheu esses dados de alfabetização a partir dos questionários básicos, aplicados em todos os domicílios brasileiros.


Para garantir a defesa da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão, a agência de jornalismo independente e investigativa Amazônia Real não recebe recursos públicos, não recebe recursos de pessoas físicas ou jurídicas envolvidas com crime ambiental, trabalho escravo, violação dos direitos humanos e violência contra a mulher. É uma questão de coerência. Por isso, é muito importante as doações das leitoras e dos leitores para produzirmos mais reportagens sobre a realidade da Amazônia. Agradecemos o apoio de todas e todos. Doe aqui.


Republique nossos conteúdos: Os textos, fotografias e vídeos produzidos pela equipe da agência Amazônia Real estão licenciados com uma Licença Creative Commons – Atribuição 4.0 Internacional e podem ser republicados na mídia: jornais impressos, revistas, sites, blogs, livros didáticos e de literatura; com o crédito do autor e da agência Amazônia Real. Fotografias cedidas ou produzidas por outros veículos e organizações não atendem a essa licença.


As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
Ver post do Autor

Postes Recentes