A paraense foi reconhecida com prêmio internacional de guarda-parques em 2023. Ela recebe visitantes no Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, no sul da Bahia, há mais de 35 anos
Texto | Paulina Chamorro
Fotos e Vídeos | João Marcos Rosa
A sorridente guarda-parque Berna Barbosa é uma das figuras mais queridas da conservação marinha brasileira. Há mais de 35 anos a paraense, original de Oriximiná, chegou no Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, o primeiro parque nesta categoria do Brasil, e passou a dedicar a sua vida para receber as pessoas que visitam esta Unidade de Conservação e auxiliar pesquisas na água e nas cinco ilhas que formam o arquipélago, no sul da Bahia.
Pelo Mulheres na Conservação, navegamos quatro horas saindo de Caravelas, para nos encontrarmos com Berna e acompanhar um pouco de sua agitada rotina, entre receber embarcações de turismo, acompanhar pesquisadoras e pesquisadores e fazer o monitoramento de ninhais e tartarugas.
A viagem foi feita em julho de 2024 e durante a navegação cruzamos com inúmeras baleias jubarte em pleno período reprodutivo. Algumas, curiosas, se aproximavam da embarcação. Entre saltos e batidas de cauda, cópulas, disputa entre machos, comportamentos típicos deste período, as horas foram preenchidas por avisos constantes da tripulação para ver o espetáculo no convés.
O arquipélago de Abrolhos visto de cima. Foto: João Marcos Rosa / Nitro
O Arquipélago dos Abrolhos e suas águas do entorno são um espaço especial. É para lá que vão várias espécies para se reproduzir em diferentes períodos do ano. O mais conhecido de todos é justamente o das baleias-jubarte (Megaptera novaeangliae), com o acasalamento e nascimento de filhotes, que se estende até outubro.
Julho também é o período de reprodução do atobá-grande (Sula dactylatra), uma espécie de ave muito querida por Berna. E foi neste mês que chegamos para conhecer de perto o trabalho de educação ambiental e de acompanhamento de estudo e pesquisa feitos nas ilhas, realizado com tanta dedicação pela guarda-parque.
Todo este amor foi reconhecido internacionalmente em 2023 com o prêmio “International Ranger Awards”, organizado pela União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN). Berna se tornou então, aos seus 60 anos, a primeira brasileira a receber este prêmio, que é um reconhecimento aos profissionais que atuam diretamente em Unidades de Conservação.
O prêmio internacional é o ápice para quem chegou muito jovem anos ao arquipélago e nem mergulhar direito sabia. Logo foi aprendendo a colaborar com o trabalho de campo nas pesquisas.
“Quando cheguei em Abrolhos e comecei a participar dos estudos, quando vi meu nome sair nas pesquisas, quase nem acreditei.Eu não sou doutora, não sou nada. Mas fiquei muito feliz e acho que foi o esforço que fiz de conhecer o lugar. Porque quanto mais você fica no lugar, mais você conhece. Se você não tiver o olhar para tudo isso, pra natureza, para tudo, você não aprende. E eu gosto muito de escutar. E esse aprender, eu ia levando pra frente, espalhando para as pessoas. E aí eu fui aprendendo. Aí agora eu já sou ajudante de pesquisador”, diz Berna, rindo.
A rotina de Berna, que é uma servidora do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), é no mar e nas ilhas.
Mal desembarcamos no primeiro dia na Ilha Santa Bárbara, onde ficam os alojamentos da Marinha e do ICMBio, e partimos para acompanhar um censo de ninhos de atobás, que em julho começam a cuidar de seus ovos. “São as baleias e as aves em época de reprodução, o amor está no ar. O amor está no ar aqui. Abrolhos é isso, é esse amor para quem sabe amar”, brinca a paraense.
Berna faz monitoramento dos ninhos das diferentes espécies de aves que nidificam e reproduzem em Abrolhos. Além dos ninhais de atobás, acompanhamos em um costão de onde se avista o Farol, também na Ilha de Santa Bárbara, o monitoramento de uma espécie mais delicada: a bela grazina-de-bico-vermelho (Phaethon aethereus). Com destreza Berna coleta, mede e observa como está o ninho,o casal de grazinas e os filhotes.
As aves e as tartarugas de Abrolhos são seus amuletos dentro e fora d’água. “O Parque Nacional não são só as baleias, é um complexo de várias espécies associadas”, comenta a servidora, explicando como também é apaixonada por estes outros bichos, que acordo com ela, lhe ensinaram a amar esse lugar.
Quando não estão em período reprodutivo, as espécies de tartaruga-marinha que chegam até Abrolhos também passam pelo monitoramento de Berna. Com uma velocidade impressionante, ela mergulha para capturar e marcar ou monitorar o estado de saúde delas.
Através de uma marcação colocada nas tartarugas é possível acompanhar dados como peso, crescimento e alimentação. As informações servem para alimentar pesquisas sobre a biodiversidade brasileira.
O monitoramento das aves marinhas que vivem no arquipélago é uma das atividades de Berna. Foto: João Marcos Rosa / Nitro
O encontro com o mar
Berna saiu do Pará, da Amazônia brasileira, para chegar no mar pela primeira vez aos 25 anos de idade. Acompanhando seu antigo companheiro, que gostava muito de mergulhar, a princípio não se identificou com o ambiente cercado de mar.
Foi só depois de um trágico incidente durante um mergulho no qual seu primeiro marido faleceu, que Berna decidiu enfrentar o desafio e resolveu ficar de vez na ilha. Começou como voluntária e foi aprendendo os caminhos da educação ambiental.
“Estou desde 1989 fazendo esse trabalho. Foi bem difícil no começo. Devagarzinho com pescadores, com as pessoas que apareciam aqui ou que vinham pescar. Quando chegava um veleiro, por exemplo, eu ia lá conversar. Aos poucos, fui aprendendo a falar com o público, a falar com mais gente, a dar uma palestra. Acho que o voluntariado é muito importante para qualquer jovem, porque ele enriquece o nosso conhecimento, dá muito mais base para você ter aquela facilidade de falar com as pessoas”, conta.
Com o tempo, Berna passou a ser uma das principais responsáveis pela manutenção da biodiversidade marinha do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e também uma porta-voz. Em outubro de 2024, foi convidada a palestrar na Universidade Federal do Sul da Bahia. Com uma plateia cheia de alunos e “fãs”.
“Eu me sinto muito honrada de contribuir com esse lugar maravilhoso, fazer essa contribuição com a conservação dos oceanos, da natureza. Saber que eu deixei minha marca aqui. Às vezes, a gente nem precisa de nada, não precisa ganhar muito. A gente precisa ter olhos e o coração abertos para cuidar de um lugar desse. Então, me sinto super agradecida por fazer parte dessa conservação dos oceanos, de Abrolhos. E saber que consegui deixar este ensinamento a várias pessoas, para cuidar de um lugar como este. Porque você tem que ter olhar e coração. E uma coisa que eu sempre falo para todo mundo: ser humilde para poder conquistar as pessoas e elas terem um olhar para esse lugar maravilhoso. Então, é só agradecimento à natureza por ter feito parte dessa história”, acrescenta.
O amor pela natureza e pelos animais exala de Berna Barbosa em cada palavra e gesto de generosidade em educar e conversar. Por isso mesmo, ela é uma das figuras mais queridas de todo o litoral brasileiro.
E como está escrito em uma pedra ao chegar na Ilha principal do Arquipélago, Abrolhos é para quem sabe amar!
As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site O Eco e são de total responsabilidade do autor.
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