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Por que a mineradora Horizonte Minerals deixou o Pará?

Por que a mineradora Horizonte Minerals deixou o Pará?

Moradores de Conceição do Araguaia afirmam que os impactos da empresa afetaram principalmente áreas rurais e assentamentos, causando muitos problemas de saúde. Eles também afirmam que autoridades estão perseguindo ativistas. Na imagem acima a obra da planta da mineradora (Foto: Divulgação).


Belém (PA) – O Projeto Araguaia Níquel, conduzido pela empresa Inglesa Horizonte Minerals, se estabeleceu na cidade de Conceição do Araguaia, no sudeste no Pará, em maio de 2022, com a justificativa de que seria fonte de benfeitorias e geração de emprego e renda para a região. Considerado um projeto de mineração de Classe 1, o Araguaia Níquel é, até então, o maior investimento em níquel do país, com a aplicação de 633 milhões de dólares em recursos para a construção do projeto e infraestrutura do entorno para a posterior extração do minério pelo período de 28 anos.

Porém, logo na fase inicial, o empreendimento gerou uma série de impactos ambientais e sociais que não foram mitigados com este recurso. Após reiteradas manifestações e pressão popular, em novembro de 2023, a Horizonte Minerals decidiu paralisar as obras, deixando na cidade de Conceição do Araguaia um rastro de poeira, incertezas e impunidade. A alegação oficial da empresa é “déficit orçamentário”.

Apesar de estarem aliviados com a paralisação da obra, os moradores não sabem o que fazer diante dos danos ambientais deixado pelo empreendimento minerário. Segundo a moradora Maria Milhomen, o maior impacto causado pela obra foi o não asfaltamento dos 144km da PA-449 que ligam a cidade de Conceição do Araguaia ao canteiro de obras. Os moradores tiveram graves problemas de saúde causados pela poeira provocada pelo trânsito de veículos pesados.

“Quando chegou a época da instalação do projeto, começaram a trafegar na estrada com vários caminhões, carretas, só veículos pesados, e desde então já começou a prejudicar as pessoas com a poeira. Devido a este trânsito pesado a estrada logo se acabou. Então eles pegaram a terra da jazida para a instalação do projeto, que era uma terra preta com cola nela e começaram a aterrar a estrada com ela. Essa poeira causada pela terra da jazida foi a pior que teve. Ela não sai da roupa, não sai da pele e começou prejudicar as pessoas, trazendo problemas respiratórios, pulmonares, de pele, todos os tipos de alergias, e problemas de visão nas pessoas que utilizavam moto para trafegar nesta estrada”, conta.

Para o morador e presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Conceição do Araguaia, Francisco das Chagas, a poeira atingiu sobretudo os residentes das áreas rurais e assentamentos, revelando a prática de racismo ambiental. Ele diz que a poeira prejudicou a vida de muitos moradores rurais da nossa região, levando até à morte.

“Perdemos companheiros que já vinham com algum problema de saúde e no final terminaram piorando e vindo a óbito. Outros ficaram com sequelas e problemas emocionais, porque já pensou, pessoas que moravam aqui há quarenta anos tiveram que deixar suas casas porque não suportavam mais. A gente tem várias denúncias, porque o desastre ambiental e das pessoas que moram aqui é grande, a gente que acompanha, chego na casa das pessoas e me dá tristeza, às vezes até saio chorando, estas pessoas tem que lavar e secar a roupa a noite, no dia não conseguem lavar porque a poeira gruda em tudo. O transtorno é demais”, lamenta. 

Francisco das Chagas diz que o hiato em relação à permanência da mineradora em Conceição do Araguaia chega a ser um motivo de alívio, mas as consequências do empreendimento deixam a população apreensiva.

“Agora a gente está aguardando e é até uma boa essa paralisação, pois esta temporada de obra deixou várias sequelas em todos nós. A gente até agora não sabe o que pode fazer para barrar tudo isso. O poder público sempre está ao lado dos maiores, mas a gente não vai parar de lutar. Tomara que quando eles voltem, se eles voltarem, que seja com responsabilidade e que pelo menos façam o asfalto deste pedaço de estrada aqui que liga Conceição do Araguaia ao canteiro de obra deles”, afirma.

Poeira na estrada de acesso à mineradora (Foto: reprodução redes sociais).

Protestos e repressão

Foto: CPT Regional Xinguara (PA) / Divulgação

Os crescentes impactos ambientais e sociais causados pela instalação da mineradora foram denunciados pela população em dois protestos e bloqueio da PA-449 realizados em agosto de 2023. As ações foram desmobilizadas pela Empresa Horizonte Minerals com o apoio do poder público.

Maria Milhomen lembra que  população dos assentamentos se mobilizou e chegaram a fazer uma paralisação na estrada, com bloqueio que durou três dias. Os moradores enfatizaram que exigiam apenas a pavimentação. Como resposta, tiveram apenas repressão.

“Depois dos três dias de bloqueio eles falaram que iam trazer um chefe de Belém para falar com a população para tratar do asfaltamento. Nós ficamos na estrada por mais um dia esperando, mas eles mentiram, chegaram com a polícia, mais de 20 viaturas, com a ordem judicial e ameaça de multa de 3 a 10 mil reais por dia de protesto. Então a nossa única opção foi nos afastar e deixar de novo eles fazerem a destruição”, conta ela. 

Além dos protestos, a sociedade civil denunciou o projeto Araguaia Níquel por meio de atas de reuniões e de uma Instrução Normativa elaborada pelo Conselho Municipal de também em agosto de 2023. O documento declarava situação de calamidade pública nas áreas afetadas pela obra e exigia a apresentação de um plano de ação efetivo para os impactos ambientais, a pavimentação das vias em um prazo de 180 dias, além da suspensão imediata do projeto. Porém, tanto as atas das reuniões como a Instrução Normativa não foram assinadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMARH), nem publicadas em Diário Oficial. 

Segundo os moradores locais, áudios atribuídos ao prefeito de Conceição do Araguaia, Jair Lopes Martins (MDB) revelam que o mesmo ameaçou exonerar a Secretária de Meio Ambiente Bárbara Lima Lins caso ela assinasse a Instrução Normativa.

“Só porque, no caso, a chefe do meio ambiente, a Secretária não pode assinar ao nosso favor, porque se ela tivesse assinado iriam pavimentar a estrada, mas devido às perseguições políticas, ela foi ameaçada de ser tirada do cargo se ela assinasse. Então, perdemos a batalha. Não conseguimos pavimentação, só que o Ministério Público está avaliando o caso, levamos todos os dossiês, fotos, vídeos e está na justiça”, conta um morador que preferiu não se identificar. 

Perseguição

A supressão das denúncias relacionadas ao projeto Araguaia Níquel se estendeu também a outros membros do Conselho Municipal de Meio Ambiente, que passaram a ser perseguidos pelas autoridades, incluindo o prefeito de Conceição do Araguaia.

O professor da Universidade do Estado do Pará (UEPA), Sandoval Amparo, responsável técnico pela elaboração da Instrução Normativa e de um dossiê revelando as irregularidades do empreendimento, foi retirado do Conselho no dia 9 de agosto de 2023, dois dias após a divulgação da Instrução Normativa.

“O nosso companheiro Sandoval, o professor, foi tirado arbitrariamente do conselho, depois que divulgamos os documentos. A Secretária de Meio Ambiente, Bárbara Lins,  que ocupa a cadeira da Prefeitura no Conselho, não quis publicar o documento, e o próprio prefeito exigiu que a UEPA tirasse o professor da cadeira da Universidade no Conselho, aí tiraram o Sandoval. A gente está batalhando pra ver se ele consegue voltar, mas é impossível, pois são políticos fortes, pessoas com alto poder aquisitivo envolvidas nisso tudo. O prefeito manda e desmanda na cidade. Mas a gente não vai se calar, a gente vai pra cima e pra luta”, revela Francisco das Chagas, que ocupa a cadeira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Conceição do Araguaia no Conselho Municipal de Meio Ambiente e participou ativamente das reuniões e elaboração do dossiê.  

A saída arbitrária de Sandoval Amparo do Conselho Municipal de Meio Ambiente foi motivo de notas de repúdio publicadas pelo Sinduepa e pela Comissão Pastoral da Terra juntamente com a Comissão de Direitos Humanos da OAB- Seccional Pará, Sociedade Paraense de Direitos Humanos, Federação dos trabalhadores da agricultura familiar, entre outras entidades da região.

“A substituição encaminhada pela coordenação da UEPA, de Conceição do Araguaia, provavelmente sofreu influência do poder executivo local, que defende os interesse da empresa Horizonte Minerals, do projeto Araguaia Níquel. Mas também, ao que tudo indica, foi devido à posição firme , competente e combativa do professor, nas reuniões do Conselho e na defesa das famílias que estão sofrendo impactos ambientais e sociais, já na fase inicial da implantação do referido minerário (…) Diante das ameaças e perseguições sofridas pelo professor Sandoval e do descaso dos responsáveis na resolução imediata dos impactos ambientais e sociais ocasionados pela implantação inicial do projeto, manifestamos nosso apoio e solidariedade às famílias atingidas e ao professor Sandoval”, afirma a nota.  

Temendo novas retaliações por parte do prefeito de Conceição do Araguaia, o professor e ex-membro do Conselho Municipal de Meio Ambiente, Sandoval Amparo, preferiu não conceder entrevista à Amazônia Real, se limitando a falar que “tudo que eu tinha a dizer eu já disse, nas matérias anteriores, no dossiê que eu fiz, nas atas do Conselho Municipal de meio Ambiente e na Instrução normativa”.

A Amazônia Real entrou em contato a Universidade do Estado do Pará (UEPA) para saber a motivação da retirada de Sandoval Amparo do Conselho, porém não teve retorno.  A reportagem entrou em contato também com a Secretária de Meio Ambiente de Conceição do Araguaia (SEMARH), Bárbara Lins, perguntando sobre a razão das atas de reuniões e a Instrução Normativa do Conselho Municipal de Meio Ambiente não terem sido assinadas e publicadas em Diário Oficial. Mas a Secretária não respondeu as solicitações da imprensa.

Já ao Prefeito de Conceição do Araguaia Jair Lopes Martins (MDB), a equipe da Amazônia Real pediu esclarecimentos a respeito das denúncias de prevaricação devido a não publicação das atas e instrução Normativa e ameaça a autonomia do Conselho Municipal de Saúde e da Universidade do Estado do Pará, porém o prefeito se negou a responder.

Durante a investigação, a reportagem apurou que este não é o primeiro caso relacionado a danos ao meio ambiente ao qual o prefeito – que também é empresário, pecuarista e radialista -, está envolvido. Ele é alvo de ação do Ministério Público Federal por agressão ao meio ambiente devido a uma obra na orla nas margens do rio Araguaia sem observância às normas ambientais, causando degradação florestal. Além disso, em dezembro de 2019 ele foi afastado por alguns dias do cargo de Prefeito de Conceição do Araguaia por improbidade administrativa e respondeu também a um processo de improbidade administrativa movido pelo Ministério Público em 2013 em Tocantins, quando o mesmo foi acusado de integrar um esquema de corrupção ligado ao então Governador Marcelo Miranda (MDB). 

Os próximos passos da estrada

Início das obras (Foto Divulgação).

No mesmo período da retirada do professor Sandoval do Conselho Municipal de Meio Ambiente e da não publicação das atas e Instrução Normativa no Diário Oficial do Município, um grupo de investidores internacionais da empresa Horizonte Minerals se deslocou até Conceição do Araguaia para ver o andamento da obra.

Segundo informações publicadas no site Brasil61 (o link com esta reportagem está abaixo, nos links de referência), após esta visita foi previsto o estouro de cerca de US$94 milhões no orçamento original da obra e o empreendimento foi imediatamente paralisado. Cerca de dois mil trabalhadores foram demitidos sem perspectiva de retorno. Desde a notícia da paralisação da obra, as ações da empresa na bolsa caíram cerca de 90%.

“Primeiro eles mudaram o diretor. Este novo diretor, chamado Fernando Marino, realizou várias auditorias e foi constatado que havia problemas seríssimos no planejamento. Aí finalmente a auditoria internacional veio e disse que não valia a pena continuar com o investimento. Aí paralisaram da noite pro dia para a surpresa de todos, porque ninguém sabia. Aí no final o prefeito ainda divulgou um videozinho com o pessoal da mineradora dizendo que o projeto ia parar”, conta uma moradora que acompanha o caso, mas que prefere não se identificar. 

Atualmente o principal questionamento da comunidade é saber se empreendimento vai voltar e, caso ele volte, se os projetos de infraestrutura e mitigação de impactos ambientais serão realizados.

“Como aconteceu este fechamento do dia pra noite aí que eles deixaram tudo de mão. Nem falaram de asfalto, porque mandaram todo mundo embora dizendo que o dinheiro não dava para terminar a obra. Os investidores vieram aqui e a empresa HZM pediu mais dinheiro para terminar a obra e os investidores se negaram e abriram uma sindicância para saber o que eles fizeram com todo aquele dinheiro que era o suficiente para fazer a obra e asfaltar a estrada”, revela Maria Milhomen, complementada por Francisco das Chagas:

“A gente não tem a informação bem clara do que está acontecendo com a mineradora aqui no nosso município. Dizem que alguns dirigentes do projeto juntamente com os administradores da cidade de Conceição do Araguaia mexeram na verba da obra”.

Em nota, a empresa Horizonte Minerals confirma que desacelerou a construção devido a um rombo no orçamento, mas que “está trabalhando em estreita colaboração com seus parceiros para chegar a uma solução de refinanciamento”

“A ação estratégica de desacelerar a construção foi necessária para garantir a longevidade do projeto e permitirá que a empresa mantenha a estabilidade financeira durante este período”, diz a nota.

Ainda em nota, a empresa alega que está concentrada em minimizar os impactos da desaceleração e desmobilização das atividades de construção, bem como garantir uma retomada segura a sustentável das atividades após este período.

Perguntada sobre o prazo de retorno das obras, se a empresa se responsabiliza pelo asfaltamento da PA-449 e sobre as denúncias de paralisação devido a supostos desvios de verbas realizados por membros da corporação juntamente com o poder executivo do município, a assessoria de imprensa preferiu não responder. 

De acordo com o Ministério Público do Pará “um procedimento administrativo foi aberto para acompanhar as medidas destinadas a identificar os impactos socioambientais da instalação e operação do projeto Araguaia Níquel, com fins de assegurar que sejam implementadas as medidas mitigadoras de impactos ambientais, assim como cumpridas as condicionantes das licenças de instalação e operações expedidas pela SEMAS/PA”.

Ainda de acordo com a assessoria do MPPA, foram expedidos ofícios requisitórios a vários destinatários, entre eles a empresa Horizonte Minerals, Agência Nacional de Petróleo (ANM), e ao Conselho de Meio Ambiente de Conceição do Araguaia. Atualmente o MPPA está na fase de conclusão da análise das informações e documentos encaminhados. 




As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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