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Vídeos fofos deturpam a percepção do público sobre o que é ter um animal silvestre

Vídeos fofos deturpam a percepção do público sobre o que é ter um animal silvestre

As leis que permitem a criação de animais silvestres e exóticos como PET variam de país para país. Nos Estados Unidos, mais especificamente, na Flórida, por exemplo, uma variedade de espécies exóticas é vendida internamente em lojas especializadas. É possível encontrar, em um rápido passeio por Miami ou qualquer cidade do entorno, diversos pet shops especializados em animais silvestres e exóticos. No entanto, este tipo de comércio também é causa de grandes problemas para a local. Qualquer um que quiser pode, gastando menos de 100 dólares, comprar um lagarto, serpente, pequenos mamíferos, anfíbios e aves dos mais diversos ecossistemas do mundo. É, inclusive, possível encontrar nestas lojas animais brasileiros que não podem ser comercializados no .

Antes de continuar esse debate, é importante distinguir os termos animais silvestres e animais exóticos: Animal silvestre aquele pertencente à fauna local, podendo ou não ser criado em ambiente doméstico, mas que não se classifica como animal domesticado, e exótico aquele que não pertence à fauna local.

Deixando de lado o debate ético sobre o tema, a comercialização de animais exóticos com potencial invasor, como iguanas e pitons, é causa de uma grande perda econômica e ambiental na Flórida, especialmente na região dos Everglades. As pítons birmanesas (Python bivittatus), animal asiático, competem habitat com os aligatores e são responsáveis por uma drástica diminuição da população de mamíferos, que são suas presas.

Píton birmanesa (Python bivittatus), invasora no Parque Nacional dos Everglades. Foto: South Florida Water Management District/Flickr.

No caso brasileiro, onde a lei sobre este tema é mais rígida e a comercialização de animais exóticos e silvestres por vias legais é cara, a demanda por estes animais muitas vezes é suprida pelo tráfico e nos apresenta um grande dilema: Ao mesmo tempo em que a flexibilização completa da gama de espécies que se pode criar como PET leva a problemas como introdução de animais invasores, abandono e maus tratos de espécimes compradas por impulso por indivíduos sem conhecimento das necessidades do animal, a total proibição desse comércio pode fomentar o tráfico de animais, que suprirá a demanda desse público ávido por uma espécie silvestre e/ou exótica.

Posto o quadro, fica claro onde está o problema: Na demanda. Surge então a responsabilidade de influenciadores digitais na criação de parte dessa demanda onde, caso apresentados estes animais de modo responsável, servem como forma de educação ambiental, inclusive utilizada por técnicos da área. Porém, quando os casos são publicizados inadequadamente, geram o efeito inverso, fomentando o tráfico e a criação irresponsável de pets não convencionais.

Pets silvestres viralizam o tempo todo nas mais diversas redes sociais, na grande maioria das vezes sem avisos sobre as condições de compra desses animais, que devem sempre ser legalizados, e condições de criação dos mesmos.

Se não bastasse isso, em certos casos mais grave, como no caso dos primatas, animais difíceis de serem criados adequadamente em cativeiro, eles aparecem constantemente acompanhados de acessórios e tratamentos inadequados para a espécie. Um relatório da Social Media Animal Cruelty Coalition (SMACC)apontou que 60% dos vídeos exibindo macacos nas redes sociais os mostravam sendo abusados fisicamente, com o uso inadequado de roupas e acessórios e praticando atividades “humanizadas”. Além deste relatório, também há uma cartilha da Sociedade Brasileira de Primatologia (SBPr) contra a criação de primatas como pets, lançada em 2021.

A apresentação de macacos prego desta maneira na internet gera interesse em diversas pessoas, que, na grande maioria das vezes não terão condições de adquirir um de forma legal, que pode chegar a custar 60 mil reais, e recorrerão ao tráfico. E mesmo no caso em que seja possível a compra de um animal legalizado, provavelmente as condições de criação serão inadequadas, assim como na imensa maioria dos primatas exibidos como pet na internet. O comércio de primatas, mesmo que legalizado, não deveria existir.

Influenciadores 

O influenciador Agenor Tupinambá, em publicação nas suas redes. Foto: Reprodução.

Não são apenas animais legalizados que são exibidos de forma irresponsável na internet, e essas ações nem sempre passam impunes: Em abril deste ano o IBAMA conduziu uma ação contra um influenciador digital que mantinha uma capivara como pet. A capivara, conhecida na internet como “Filó”, foi retirada do influenciador, além de ter sido aplicada uma multa de 17 mil reais por infrações envolvendo diversos outros animais explorados em suas redes sociais. Rapidamente vídeos em defesa do influenciador e de ataques ao IBAMA viralizaram nas redes e, junto com a pressão política de uma deputada estadual do AM, e de um deputado federal, uma decisão judicial foi emitida durante a noite desautorizando o IBAMA e devolvendo o animal ao influenciador, mas com a proibição de exibi-lo nas redes sociais.

É importante esclarecer que capivaras não podem ser criadas como pet. Elas são hospedeiras de carrapatos do gênero Amblyomma, transmissores da febre maculosa, além de serem animais gregários, impossibilitando que haja um manejo correto de um indivíduo isolado de seu bando. Ao legalizar (ou não) a criação de determinados pets não convencionais, são analisados, além do potencial invasor da espécie, questões como a transmissão de zoonoses e a facilidade no manejo (aí está o principal problema da criação de primatas). A influência da criação de capivaras como animais de estimação na internet pode gerar, além do desconforto e risco à vida dos animais, risco à saúde e à vida humana.

Ao mesmo tempo, existem também animais legalizados que são de fácil manejo e não representam risco para os humanos, como diversos répteis. Porém, até no caso desses animais, a apresentação sem a explicitação das condições de compra e criação dos mesmos pode influenciar a compra pelas vias do tráfico, os maus tratos, pelo desconhecimento que se tem das necessidades do animal, e o abandono. Por isso, alguns animais silvestres legalizados são vendidos microchipados. Há uma fiscalização sobre esta venda que evita o abandono por parte de quem compra. Pelas vias legais, o comprador se torna responsável pelo animal, e incorre em infrações caso não cumpra com suas obrigações.

 A exposição sem responsabilidade de animais silvestres como Pets não é um problema novo, mas tem se potencializado com as redes sociais. De acordo com um recente relatório do google, metade dos jovens trocaram as ferramentas de busca do google pelo Tik Tok ou pelo Instagram, e a responsabilidade dos criadores de conteúdo cresce conforme cresce o seu alcance. Ações do IBAMA e o trabalho de educadores da área – na internet e fora dela – em instruir sobre a criação responsável de pets não convencionais talvez sejam a única forma que temos hoje de reduzir a demanda gerada pela irresponsabilidade de certos criadores de conteúdo neste nicho. Infelizmente, o último exemplo que presenciamos desta tentativa de contenção de danos nos mostrou que, talvez, também enfrentaremos a oposição de políticos que dizem lutar pela causa animal, apesar do total desconhecimento sobre fauna silvestres, e de influenciadores que, apesar de não participarem diretamente do problema, usam seu espaço na internet para defender as atitudes cruéis de quem lucra com a exploração destes animais e, indiretamente, fomentam o tráfico de animais silvestres, a terceira maior atividade ilegal do mundo.

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site O Eco e são de total responsabilidade do autor.
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