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“Vão sair na paz”, diz minerador José Altino Machado

“Vão sair na paz”, diz minerador José Altino Machado
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A saída voluntária de garimpeiros ilegais da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, começou a ser detectada neste fim de semana, inclusive pelo governo federal. Em grupos de Whatsapp eles protestam, mas dão sinal de resistência (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real/2021)


Por Felipe Medeiros e Kátia Brasil, da Amazônia Real.

Boa Vista (RR) – Com o fechamento do espaço aéreo sobre a Terra Indígena Indígena Yanomami (TIY), no norte de Roraima, começaram a circular, neste fim de semana, vídeos de grupos de garimpeiros fazendo a “varação”, caminhando a pé e abrindo picada na floresta, um percurso que pode durar 30 dias até chegar nas cidades de Alto Alegre, Iracema ou Mucajaí. Abandonados pelos financiadores da mineração ilegal, os garimpeiros – homens e mulheres -, saem voluntariamente do território com medo de serem presos pela Polícia Federal, que deve, junto das Forças Armadas, iniciar nos próximos dias a desintrusão dessas pessoas, como anunciou o ministro da Defesa, José Múcio. E deixam para trás um rastro de destruição socioambiental e esgotamento dos recursos naturais que provocaram, nos últimos quatro anos, a maior crise humanitária contra indígenas na atualidade da Amazônia.

A Operação Escudo Yanomami, determinada em decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), criou uma Zona de Identificação de Defesa Aérea (Zida) no espaço aéreo da terra indígena. Qualquer aeronave ilegal que sobrevoar o território será abatida. Há informações não oficiais e não confirmadas de conflitos entre os próprios garimpeiros nesta “varação” no meio da mata. Em entrevista exclusiva à Amazônia Real, o minerador José Altino Machado, diretor da Associação dos Moradores do Alto Tapajós (Amot) e fundador da União Sindical dos Garimpeiros da Amazônia Legal (Usagal), negou a existência de conflito entre garimpeiros ou com as forças militares. 

“Eles vão sair em paz sem reagir, como nunca reagiram. Inclusive, na década de 90 quando tiraram 40 mil, não houve tiroteio em lugar nenhum. É só chegar e falar assim: ‘Vocês vão sair por bem e com seus pertences, se vocês não saírem por bem irão perder os pertences, inclusive as aeronaves’. Sai todo mundo, tem que sair sob vigilância”, afirmou o veterano minerador, mas não sem deixar de fazer um alerta:

“Não tem como tirar o pessoal de lá com o espaço aéreo fechado. Não tem como. Ou abrem uma janela de dez dias e manda o pessoal [mineradores] tirar os garimpeiros ou dar uma instrução de recuo para três quatro pistas lá dentro e o pessoal da FAB tira. O retorno a pé pode dar tragédia porque eles estão na Serra do Querosene. Lá é habitado por Yanomami arredios, não chegam perto de ninguém. Estão se eles encontram os garimpeiros vai dar conflito”.

Altino acredita que ao menos 2.000 homens já saíram do garimpo nas últimas semanas, a partir do dia 21 de janeiro, quando Lula foi a Roraima anunciar o fechamento da terra indígena. “Se tiver 12 mil, 15 mil homens lá ainda é muito. Quando saímos de lá [nos anos 90], voltamos todos para nossas casas em busca de novas descobertas”, disse.

Perguntado sobre onde será o destino dos garimpeiros de Roraima, José Altino afirmou “no Tapajós”, região do Pará, que já é afetada por inúmeros garimpos ilegais nas terras Munduruku. “Quando Marina Silva foi ministra do Meio Ambiente do próprio Lula, ela criou parques [unidades de conservação] onde tinha atividade humana, no Tapajós, em Altamira [no Pará]. O que aconteceu com esses homens? Foram todos para lá. Eles vão voltar para o Tapajós. Eles são de Altamira, Tapajós e Mato Grosso e um percentual de Rondônia”.

O minerador, que já atuou em garimpos na Amazônia nos anos 1970 a 1990 e é aliado do ex-vice presidente da República e hoje senador, general Hamilton Mourão (Republicanos),  disse que o governo Lula tem que dar condições para os homens que estão deixando Roraima. “O  problema é social e tem que dar condição, se não vão se criar uma série de cracolândias pelo Brasil. Não adianta o Lula ficar criticando o Bolsonaro. A responsabilidade de Bolsonaro tem que ser entregue ao Ministério Público, que cuida dos assuntos criminais e à Justiça Federal. É obrigação institucional do MP cuidar das unidades indígenas do Brasil”, disse ele.

A Amazônia Real está monitorando grupos de garimpeiros nas redes sociais. Num vídeo, ao qual a agência teve acesso, homens aparecem dentro do garimpo dizendo que a comida está acabando e desdenha dos Yanomami, que surgem nas imagens magros e desnutridos. “´Nós queremos ajuda pra gente ir embora do garimpo. Tá todo mundo aqui com fome e estamos dividindo a comida com os índios. A gente quer sair fora daqui tá acabando o rancho”, disse o homem, informando que não chega mais alimentos como antes, pois as principais rotas do fechadas pelos rios Catrimani, Couto Magalhães, Mucajaí e Uraricoera. 

A TIY tem 9,4 milhões de hectares, entre os estados do Amazonas e Roraima, com limites na fronteira com a Venezuela. Segundo a Hutukara Associação Yanomami (HAY), presidida por Davi Kopenawa, no território vivem 33 mil indígenas. O garimpo de ouro e cassiterita (estanho) degradou, conforme estudo da plataforma Mapbiomas, 1.556 hectares de florestas e rios no território Yanomami, em 2021. A Hutukara estima que a destruição atingiu um total de 3.272 hectares no mesmo ano.

“Direitos humanos”

Nos grupos de Whatsapp, os garimpeiros que partem para “varação” apelam para que os “direitos humanos” intercedam em favor deles para abandonar o cenário de destruição que dizem querer deixar para trás. Uma mulher de garimpeiro de nome Shelly, com celular do Maranhão, foi direta:  “A situação está complicada pq o governo não quer as pessoas nas área indígena mas não deixa o povo sair dele como é que isso pode acontecer cadê os direitos humanos”. Outra jovem, acompanhada de quatro outras mulheres, mencionou um vídeo que circula no Facebook e reforçou o pedido de “ajuda para que acione os recursos (direitos?) humanos”: “O Lula se pronunciou que está mandando helicópteros, essas coisas, para resgatar. Isso é mentira. Não estão resgatando ninguém”. 

“Alguma autoridade  sabe qual o tempo determinado para os geripeira (garimpeiros) saí [sic] porque muitos precisam do espaço sério (aéreo?) Estamos sabendo que está fechado, precisamos de tempo pelo menos 10 dias para saímos  que muitos dependem de aeronave estamos sabendo que está fechado queremos sair  obedecendo as lei sem nenhum problema”, afirmou uma outra mulher de garimpeiro, de prefixo de telefone de Roraima, na quinta-feira (2). Um minuto depois, um homem responde: “Infelizmente amigo, eles não falaram nada”; “Dizem que a operação já começou”; “Ontem as 00:00 hrs”. A mulher envia, em seguida, um áudio no qual disse: “Estamos sabendo, mas eles têm que dar um tempo determinado pra gente sair e vamos botar no grupo aí pra ver se eles liberam esse espaço aéreo para sair todo mundo ”.

No sábado (4), a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, voltou a Roraima para acompanhar os atendimentos aos yanomami transferidos para a capital Boa Vista, em condições graves de saúde. Ela viajou acompanhada de uma comitiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entidade da qual já foi coordenadora-executiva. Em coletiva à imprensa, a ministra confirmou que “muitos garimpeiros” estão saindo voluntariamente de dentro da TIY. “Mas é bom que saiam mesmo, porque assim a gente até diminui a operação que precisa ser feita para retirar 20 mil garimpeiros, [o que] demora um tempinho.”

Dois dias após a publicação do Decreto 11.405, de 30 de janeiro, que trata do enfrentamento da emergência em saúde pública de importância nacional e de combate ao garimpo ilegal, e estabelece uma zona restrita de circulação por sobre a TIY, a Força Aérea Brasileira (FAB) passou a controlar o espaço aéreo. 

Mapa dos voos na TI Yanomami (Arte: Giovanny Vera/Amazônia Real)

A TIY foi dividida em três, sendo permitida na “Área Vermelha, somente as aeronaves envolvidas na Operação Escudo Yanomami 2023”. Quem descumprir essas restrições poderá até ser abatido. 

Na rede social Whatsapp, uma mulher que gravou um vídeo acompanhada de outras quatro jovens reforçou que a “varação” (caminhada) não é possível de ser feita por todos, e que os voos, mais rápidos e eficientes meios de transporte para as áreas distantes dos garimpos ilegais, estão com preços exorbitantes, prática já denunciada na série Ouro do Sangue Yanomami, produzida em parceria pela Amazônia Real e Repórter Brasil. O espaço aéreo vinha sendo controlado pelos garimpeiros.

“Os helicópteros estão cobrando 15 mil reais para sair. A gente tem 3 mil, mas 15 mil é claro que não tem. Eles querem enricar (enriquecer) numa situação dessa”, protestou contra o lucrativo negócio de transporte aéreo ilegal. Quem ficou em áreas mais extremas da TIY, como a de Surucucu, está cercado, porque não é possível sair de barco ou por terra. A jovem ainda chegou a falar em tom de ameaça: “Estamos presos aqui e daqui a uma semana não vamos ter mais alimentação. E os índios vão começar a ficar estressados, porque a gente dá alimento para eles. Então eles vão ficar estressados, todo mundo vai ficar com fome.“

O minerador José Altino Machado justificou, à Amazônia Real, por que os financiadores do garimpo ilegal não cuidam de promover a retirada segura dos garimpeiros: “A relação capital-trabalho do garimpo é a mesma da pesca, é coparticipação de tudo. O resto é frete que eles pagam os aviões e helicópteros. Todo mundo ganha com o risco da empreitada. O que não impede essa coisa [abandonar os garimpeiros], tem gente má e boa no mundo todo”.

Ainda em um dos grupos de Whatsapp, uma mensagem de voz ironizava: “Vão trazer um submarino para colocar no rio Uraricoera e no Mucajaí é? Rapaz, vou te contar, garimpeiro não é bandido não”. Outra interagia: “Positivo, é verdade, como eles querem combater, querem tirar todo mundo se eles não vão dar assistência e tão proibindo os voos, como que eles querem que saiam?! Isso que tô imaginando como é que vai sair esse horror de gente”, questionou.

Jailson Mesquita, coordenador político do “Movimento Garimpo é Legal”, confirmou à reportagem que antes do anúncio do controle do espaço aéreo por parte da FAB já registrava a saída parcial de garimpeiros. “Praticamente desde o anúncio de que iria se fechar o garimpo, né? E aí sim, a gente começou a fazer esse convencimento para pedir que as pessoas saiam de forma voluntária. Muita gente está saindo, eles estão saindo, inclusive a recomendação nossa do movimento é que saiam de forma que a gente busque através do diálogo com o poder público de forma oficial, como manda a legislação, buscar a área de trabalho para eles [em referência às terras não indígenas].

O movimento em defesa dos mineradores representa 600 mil pessoas dos estados do Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima, conforme disse Mesquita. Desse total, há estimados 30 mil garimpeiros no TIY – o número é maior que o divulgado por instituições e órgãos de defesa ambiental e indigenista que afirmam ser 20 mil pessoas. 

Políticos pró-garimpo

A saída antecipada dos garimpeiros ilegais teve início, na verdade, após o secretário de Segurança Pública do Estado, coronel Edison Prola, ter informado durante uma entrevista a uma rádio de Boa Vista que o governo federal faria, em até 90 dias, uma operação para encerrar o garimpo no TIY. O militar participou de reuniões de transição do governo Lula dias antes da entrevista, que ocorreu em 15 de dezembro de 2022. O comportamento dele chamou a atenção e foi duramente criticado nas redes sociais. À época, Psol e Urihi Associação Yanomami, pediram que o Ministério Público Federal (MPF) investigasse Prola por vazar informação sigilosa.

Assim como seu secretário, o governador Antonio Denarium (PP) se mostrou em seu primeiro mandato favorável às pautas anti-indigenista e pró-garimpo. Chegou a sancionar duas leis benéficas aos garimpeiros ilegais. Uma das matérias é de autoria do próprio governador de Roraima, bolsonarista declarado e que continua defendendo Bolsonaro, a quem o governo de Lula tenta enquadrá-lo no crime de genocídio por conta da crise humanitária entre os Yanomami.

As leis de Roraima foram aprovadas pelos deputados na Assembleia Legislativa e sancionadas pelo chefe do Executivo. A vontade do governador de regularizar o garimpo começou em 2020, quando ele enviou para a Assembleia Legislativa o Projeto de Lei nº 201/2020, que dispõe sobre o licenciamento para a atividade de lavra garimpeira. Os parlamentares que votaram a favor do garimpo foram, conforme noticiou o site G1, são: Éder Lourinho (PTC), Jeferson Alves (PTB), Jalser Renier (SD), Betânia Almeida (PV), Catarina Guerra (SD), Ione Pedroso (SD), Jorge Everton (MDB), Ângela Águida Portela (PP), Aurelina Medeiros (Podemos ), Renan Filho (PRB), Gabriel Picanço (PRB), Dhiego Coelho (PTC), Chico Mozart (PRP), Coronel Chagas (PRTB), Janio Xingú (PSB), Marcelo Cabral (MDB), Odilon Filho (Patriota) e Tayla Peres (PRTB).

Única a votar contra o projeto do garimpo na TIY, a ex-deputada estadual Lenir Rodrigues (Cidadania) entrou com Requerimento (nº 106/2020) pedindo adiamento da votação. A proposta entrou novamente na Ordem do Dia da Casa Legislativa em setembro de 2021, quando foi aprovada e sancionada, passando a ser a Lei nº 1.453/2021. No mesmo mês, o Superior Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional. A decisão foi do ministro Alexandre de Moraes.

Em 2022, Denarium (cujo nome real é Antonio Oliverio Garcia de Almeida, e que optou por incorporar a palavra dinheiro ao sobrenome) cedeu à pressão de inúmeros garimpeiros e sancionou uma lei que protege seus equipamentos e materiais. Entretanto, em Roraima não existe garimpo regularizado. A Lei 1.701 de julho de 2022 proíbe agentes de fiscalização de destruírem maquinários de invasores. A matéria foi de autoria do ex-deputado estadual George Melo (Podemos). 

O MPF considerou como inconstitucional “na medida em que tenta esvaziar os instrumentos de fiscalização ambiental previstos em legislação federal”. Em recente entrevista, Denarium sugeriu que “eles [indígenas Yanomami] têm que se aculturar, não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho”.

Medo da prisão

Sobrevoo regista áreas de garimpos ilegais dentro da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, em abril de 2021 (Foto: Christian Braga/Greenpeace)

Um garimpeiro ouvido pela reportagem da Amazônia Real informou que a sua saída da floresta e a de mais 40 homens ocorreu de forma espontânea. “Tá saindo, tão com medo desse movimento do Lula”, declarou. Magro, pele ressecada e manchada de horas de sol escaldante, o garimpeiro concedeu a entrevista deitado em uma rede na casa da filha, em Boa Vista – onde vive atualmente. Ele garantiu que desistiu da atividade ilegal e vai tirar os documentos para voltar a ser caseiro com “carteira assinada”. Em fevereiro, ele vai retornar ao trabalho em uma fazenda na região do Apiaú, município de Mucajaí, no norte de Roraima, ironicamente perto de onde garimpava dentro do território dos Yanomami. 

“Esse garimpo já existia. Mucajaí já tinha pista de garimpo e tudo, desde a época que (Fernando) Collor foi eleito. Na época, antes do Collor, foi (José) Sarney que era o presidente. Naquela época já tinha os garimpos. Aí o Collor entrou, fechou os garimpos, aí deu aquela segurada e depois começaram de novo”, informou o dono da propriedade que o garimpeiro vai trabalhar.

Segundo esse fazendeiro, a ida ao garimpo na região ocorre de barco ou de avião. A primeira opção só no período chuvoso. Saindo de Boa Vista até o porto improvisado nas margens do igarapé Maranhense são 170 quilômetros (pela BR-174 até a vicinal 23). De acordo com ele, houve um aumento no movimento de garimpeiros em Mucajaí nos últimos três anos. O tráfego aéreo também se intensificou em torno dessa corrida pelo ouro de sangue dos Yanomami. “Eles começaram a trazer helicóptero porque rende demais a viagem. O índice de aeronave que passa lá em cima [na fazenda], no caso tem dia que, agora está meio devagar, mas tinha dia que passa dez aviões e dez helicópteros todo dia”, informou o fazendeiro, acrescentando ter medo de acidentes em sua terra porque as aeronaves voam baixo para fugir dos radares. 

Negociações ilícitas

Davi Kopenawa Yanomami (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)

Como em outros canais de comunicação bolsonaristas, circulam entre os grupos de Whatsapp dos garimpeiros informações difíceis de serem checadas, muitas com sinais de desinformação. Em um áudio, alguém pergunta aos cerca de 100 colegas que fazem parte do grupo: “Bom dia grupo dos garimpeiros, alguém tá sabendo daquela senhora que tava fazendo uma varação aí por rumo do Uraricoera e não aguentou e faleceu. Alguém sabe alguma informação dela?” [transcrito de áudio]. A foto do cadáver de uma mulher havia sido divulgada no dia anterior. Em áudios, outras pessoas comentam dessa morte.

Na manhã de quinta-feira (2), um garimpeiro com a identificação “Deus É Bom” comentou a notícia sobre a gravidez de meninas yanomami estupradas por garimpeiros, relatada pelo ministro Silvio Almeida (Direitos Humanos) e também pelo secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Ariel de Castro Alves. Em áudio, o garimpeiro disse: “Rapaz, agora se isso aí for verdade aí complica ó, aí complica mais a nossa vida, é complicado isso aí ó”. Um outro interagiu: “Agora vão falar muitas coisas. Agora que tá começando”. O anterior voltou a se pronunciar: “Mas infelizmente, infelizmente mesmo, tem garimpeiro que faz isso mesmo ó bicho, infelizmente ó”, disse em mensagem de voz. 

Outro, porém, um dia depois, respondendo em atraso, destilou seu ódio contra os Yanomami: “Isso aqui é uma pura mentira que onde eu trabalho. As chinocas são tão sujas, fedorentas, feias e tenho certeza que garimpeiros não tenham estômago pra isso. Dizer que criança Yanomamis são abusadas por garimpeiros. Ao contrário, elas são abusadas e estupradas pelos próprios índios. Todos sabem dessa realidade que isso acontece entre eles …essa é a verdade nua e crua”.

Em entrevista exclusiva à Amazônia Real, Davi Kopenawa já havia denunciado abusos e infecções sexualmente transmissíveis (IST’s) nas mulheres yanomami. Na ocasião, o maior líder do povo Yanomami também reforçou suas denúncias sobre o narcotráfico, que agora começam a ser admitidas entre os garimpeiros. 

“A gente leva o nome de sujo e tal e tudo enquanto pelos outros né, porque se eles acabassem com o problema de traficante né, num tava.. O garimpo não era tão falado do jeito que tá né?! É muita droga, muita arma”, afirmou um garimpeiro em outro áudio transcrito pela reportagem. “Se eles fecharem do jeito que eles tão falando [na matéria] pode se preparar, que não vai ficar ninguém dentro do mato, não vai ficar ninguém, se eles se preparem do jeito que tão falando eles vão prender muito nego ó, vão, vão prender muito nego, assassino, é traficante, garimpeiro, homem trabalhador, vão prender todo mundo do ‘jeitin’ que fizeram lá em Brasília, não vai escapar ninguém, se eles botarem pra pegar não escapa ninguém.”

Um garimpeiro da região do Pupunha, em Mucajaí, concordou, em resposta de áudio para o colega: “Eu trabalho no garimpo já faz três anos, no Pupunha, nunca pensei em ir pro Uraricoera por causa disso aí, de facção. Lá tem demais”. E continuou: “Essa operação também aí tá sendo mais forte porque pegaram muito avião esses tempos aí com muita droga né cara e isso impacta muito no garimpo né. E essas drogas eu creio que nem é tanto pro garimpo mas tá nas pistas que vai pra garimpo, tá nos avião que vai pra garimpo, então isso complica muito né”. Uma mulher responde o áudio com “Vdd”, uma abreviação da palavra verdade.

Em 2021, a Amazônia Real revelou que garimpeiros integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) atacaram com armas a comunidade Palimi ú, na Terra Indígena Yanomami. Segundo o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye´kuana (Considi-Y), Junior Hekurari, até mesmo a vestimenta dos invasores era diferente. “Eles estavam de preto. A comunidade achou esquisito a roupa deles. Disseram que algumas roupas estavam escrito ‘polícia’. Muito estranho isso”. 


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