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TedxAmazônia 2023: ativistas fazem alertas

TedxAmazônia 2023: ativistas fazem alertas

O evento, realizado no último fim de semana em Manaus (AM), mobilizou cerca de 500 pessoas em discussões de questões relacionadas à Amazônia. Enquanto as palestras aconteciam, uma densa fumaça sufocava a capital como consequência da seca histórica. Na imagem acima, a cofundadora da Amazônia Real, Elaíze Farias (Foto: Alonso Martins/602/TEDxAmazônia).


Manaus (AM) – A fumaça densa que sufoca Manaus desde setembro deste ano fez parte da paisagem do TEDxAmazônia 2023, evento promovido por uma plataforma de conferências que realiza os mundialmente famosos TED talks, palestras conduzidas por pensadores e líderes de diferentes regiões. Na capital amazonense, o local escolhido para a iniciativa, entre os dias 2 a 5 de novembro, foi o Armazém XV, no Centro, uma das mais antigas construções do complexo do porto de Manaus, às margens secas do rio Negro, que enfrenta a estiagem mais severa e sem precedentes em 121 anos.

Das grandes janelas do galpão de ferro onde aconteceram as palestras, a vista para o rio foi engolida pelo cinza da poluição. Além do calor extremo, nas primeiras horas do sábado (4) a fumaça, causada pelas queimadas criminosas no Amazonas, se tornou novamente insuportável na cidade, invadindo as casas e tirando o sono dos manauaras e dos visitantes que estavam na capital. A qualidade do ar em Manaus chegou a ser considerada perigosa para a saúde humana na parte da manhã, quando marcou 440 ug/m3,  segundo o site do projeto Índice de Qualidade do Ar Mundial. 

A fumaça intensa fez desaparecer a beleza do rio Negro enquanto líderes indígenas, ambientalistas, cientistas, jornalistas e artistas apresentavam ideias, contavam histórias e falavam de suas trajetórias no evento. Cinquenta convidados palestraram, a maioria são da Amazônia. Foi uma edição diferente do primeiro TEDxAmazônia, realizado em 2010, quando a maioria, embora desenvolvesse trabalhos na região, não era da Amazônia. 

A jornalista Elaíze Farias, cofundadora e editora de conteúdo da Amazônia Real, foi uma das palestrantes e alertou para os crimes ambientais na Amazônia. Ela participou no bloco Resistência, na tarde do dia 4 de novembro, junto com o indigenista Txai Macedo, a liderança indígena Maial Paiakan Kayapó, a quebradora de coco babaçu Dona Nice, o rapper e ativista comunitário Jander Manauara e a quilombola e ambientalista Valcléia Solidade.

“Quem conseguiu dormir bem nesta noite? Na minha casa a fumaça entrou mesmo com o quarto trancado e com ar condicionado. Nunca vi fumaça de queimadas em novembro. Neste mês era para estarmos com as primeiras chuvas da estação”, disse, lembrando que mais do que falar de crise climática ou vazante extrema é preciso “botar o dedo na ferida” e apontar quem são os causadores dos crimes ambientais, como queimadas e desmatamento, e o que precisa ser feito para combater essas ações. 

Ela lembrou que a injustiça climática afeta sobretudo os grupos em situação de vulnerabilidade. “A principal causadora é a economia neocolonialista que repete a exploração dos recursos naturais e continua violando direitos das populações que dependem da floresta”, disse. “São desmatadores, grileiros, pecuaristas. E muitos deles com apoio dos governos negacionistas da Amazônia”, denunciou.

A ativista socioambiental Ângela Mendes, filha do líder ambientalista e seringueiro Chico Mendes (1944-1988) e coordenadora do Comitê Chico Mendes, subiu ao palco também no dia 4, na sessão Jardineiro. No terceiro dia de palestras, ela clamou por justiça em relação aos vários assassinatos  de defensores ambientais na região amazônica. 

“O rio não espera mais, a floresta não espera mais. Os povos estão lá nos territórios sendo ameaçados, sendo assassinados. Não podemos deixar o sangue de Chico Mendes, de Irmã Dorothy (Stang), de José Cláudio (Ribeiro da Silva) e Maria (do Espírito Santo), de Maxciel (Pereira dos Santos), de Ari Uru-Eu-Wau-Wau, de Paulino Guajajara, de Dom Phillips e Bruno Pereira, de Marielle Franco, de Mãe Bernadete… esse sangue não pode ter sido em vão”, afirmou a ativista.

Ângela Mendes, ativista socioambiental (Foto: Alonso Martins/602/TEDxAmazônia).

Diante da urgência em falar sobre a crise climática, ela evocou a defesa da floresta e dos povos indígenas ameaçados em seus territórios. “Não podemos sair daqui da mesma forma que chegamos. A gente precisa lutar hoje, não esperar mais, porque a floresta não espera. Os povos indígenas estão sendo ameaçados, assassinados e isso também não espera. A floresta só tem valor em pé”. 

Na sexta-feira (3), a ministra do e Mudança do Clima, Marina Silva, se limitou a falar sobre os esforços do Amazonas e do governo federal contra o desmatamento da floresta, mas não explicou que ações serão tomadas contra quem está desmatando, apontando a culpa também para as queimas domésticas em quintais. Em outubro, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) afirmou que as queimadas são causadas por agropecuaristas.

“Temos de combater o desmatamento porque a maior parte das queimadas acontece em função do desmatamento. Já estamos com um plano de prevenção e controle do desmatamento, mas também tem que se trabalhar programas de educação ambiental para que a população não toque fogo nos quintais, nos terrenos e, sobretudo, para que se tenha uma ação conjunta entre governo do estado e governo federal”, disse a ministra.

O TEDxAmazônia 2023 teve como proposta discutir bioeconomia, produção sustentável, ciência e tecnologia, combate ao desmatamento, conservação da , entre outros assuntos relacionados à “vastidão da Amazônia”. A conferência mobilizou cerca de 500 pessoas e é um dos 12 eventos de vários países do mundo que fazem parte do TED Countdown, a iniciativa climática da conferência. 

Um dos patrocinadores do evento, o Governo do Amazonas foi procurado pela reportagem, mas não respondeu qual valor destinou para a organização do TEDxAmazônia.

Defensores ambientais são os mais ameaçados

Claudelice da Silva Santos, ativista e protetora da floresta (Foto: Alonso Martins/602/TEDxAmazônia).

Também na sexta-feira, a defensora dos direitos humanos, Claudelice da Silva Santos, do Pará, narrou à platéia do TEDxAmazônia 2023 a sua luta por justiça após o assassinato do irmão, José Cláudio Ribeiro dos Santos, e da cunhada, Maria do Espiríto Santo, em 2011. Zé Claudio e Maria foram vítimas de uma emboscada de pistoleiros por denunciarem os crimes ambientais na região.

Emocionada, Claudelice lembrou da participação de Zé Cláudio no primeiro TEDxAmazônia, há 13 anos. “É muito importante que não nos esqueçamos e é muito importante que carreguemos esse legado. Zé Cláudio e Maria foram sementes”, disse.

Claudelice lutou ao lado de seus familiares pelo direito de acesso à terra e denunciou violações de direitos humanos resultantes de grilagens, exploração ilegal de madeira e crimes contra o meio ambiente. A defensora já foi submetida a uma série de ameaças devido às suas atividades. 

“Nós mulheres, que estamos na frente de muitos territórios, precisamos ser vistas e ouvidas. Para que entendam as especificidades de ser mulher”, enfatizou.

Ela reforçou que é urgente não só falar da defesa da floresta, mas também dos povos que a defendem. “São importantes espaços como esses que falam sobre a defesa da floresta e dos recursos naturais, mas também do povo que defende a floresta”.

O jovem indígena Bitaté Uru-Eu-Wau-Wau relatou como foi liderar uma expedição para denunciar os invasores nas terras demarcadas do seu povo, cujo território fica em Rondônia e é ameaçado por grileiros e desmatadores. Essa é contada no filme “O Território”, vencedor de duas categorias no Festival Sundance de Cinema: Prêmio do Público e Prêmio Especial do Júri para Arte Documental.

Bitaté vive na aldeia Jamari, na Terra Indígena (TI) Uru-Eu-Wau-Wau, e é fotógrafo e comunicador da Mídia Índia e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia. Ele destacou a existência dos mais de 114 povos indígenas isolados do e enfatizou: “Proteger os isolados é proteger o futuro”.

O líder indígena chamou atenção para a existência de teses como a do Marco Temporal, que provocam retrocessos nos direitos dos povos indígenas. “Temos vários projetos de lei que são contra os povos indígenas. E a gente está aqui para proteger o nosso território, a nossa floresta, porque a nossa casa é o nosso território. As mudanças estão acontecendo e o nosso planeta está pedindo socorro”, alertou.

Bushe Matis, liderança indígena do povo Matis e presidente da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), afirmou que a região da Terra Indígena do Vale do Javari é invisível para o mundo e não está protegida. “Ninguém sabe o que se passa ali, o Vale do Javari pede socorro”, apelou.

Segunda maior terra indígena do Brasil, o Vale do Javari fica entre as cidades de  Atalaia do Norte e Guajará (AM), na fronteira com o Peru. A região é tomada por invasores como pescadores ilegais, que retiram produtos naturais de forma não autorizada do território. O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, em junho do ano passado, acentuou o cenário de insegurança enfrentado pelo indígenas.

Bushe disse que a equipe de vigilância do Vale do Javari trabalha para que o monitoramento territorial proteja os 19 povos isolados na TI. “Eles precisam sobreviver com terras protegidas, rios e floresta. O Vale do Javari é um patrimônio do Brasil que pode garantir a sobrevivência dos seres humanos”.

A liderança apontou ainda que os defensores do Vale do Javari estão empenhados em capacitar os jovens indígenas na luta pelo território e mapear a presença de invasores com ferramentas tecnológicas e o uso da nossa força e conhecimentos tradicionais.

Conhecimento ancestral 

Vanda Witoto, liderança indígena (Foto: Robert Coelho/602/Amazônia Real).

A ativista indígena Vanda Witoto fechou o evento, também no dia 04, reforçando a importância da preservação dos povos originários. “Esse é o momento importante para nós, porque as nossas vozes precisam chegar a esses lugares também. E como representante dos povos indígenas, mulher Witoto que sou, trago a responsabilidade de comunicar as lutas do nosso povo e enfrentar os desafios dessa população no Amazonas”, disse.

Articuladora política da Associação dos Witoto do Alto Rio Solimões e empreendedora social, ela chamou atenção para o uso do conhecimento ancestral dos povos indígenas como uma “tecnologia muito importante”. “Somos a mais potente ciência e tecnologia ancestral que vocês podem acessar no dia de hoje. Acessar as nossas memórias, a nossa identidade. Para que vocês possam se reconhecer na natureza. É com essa mensagem que precisamos sair daqui hoje”, declarou.

Enquanto cantava, a ativista convocou mulheres indígenas para dançar no palco e provocou: “Onde está o futuro? O futuro está presente. Os povos originários têm feito um chamado, assim como a terra, para um caminho de volta. O chamado dessa terra a um caminho de volta é para nos reconhecermos como natureza. Quero convidar vocês para que a gente possa abrir nosso coração para uma escuta ancestral”.


As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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