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Regularização fundiária em Unidades de Conservação vai levar 490 anos, no passo que está

Regularização fundiária em Unidades de Conservação vai levar 490 anos, no passo que está

No dia 26 de novembro de 2023, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão o Ministério do Meio Ambiente que cuida das áreas protegidas no país, se reuniu com organizações da sociedade civil e Ministério Público Federal para discutir a criação de um Conselho Nacional de Regularização Fundiária em unidades de conservação. O encontro foi mais uma das ações para tentar resolver o enorme passivo que ainda existe nas áreas protegidas brasileiras e, assim, garantir sua efetiva implementação.

Atualmente, o Brasil possui 336 Unidades de Conservação federais. Somadas, elas abrangem 172 milhões de hectares, uma área equivalente ao território da Bolívia e Chile somados. Desse total, pelo menos 26 milhões de hectares precisam passar por algum tipo de regularização, segundo o órgão.

São estações ecológicas, florestas nacionais, parques, reservas da biosfera, monumentos naturais, reservas de desenvolvimento sustentável e reservas extrativistas cuja titularidade da terra precisa estar nas mãos do ICMBio para que o órgão possa fazer adequadamente sua gestão.

Segundo o órgão ambiental, entre 2019 e 2022, foram desapropriados apenas 26 mil hectares em áreas protegidas para tal fim. Nesse ritmo, e mesmo sem adicionar nenhuma nova unidade de conservação, o país levaria mais 490 anos para zerar o passivo hoje existente, diz o ICMBio.

Para o WWF e a Rede Pró-UC, no entanto, o buraco é ainda maior. Segundo levantamento das organizações, as áreas dentro de unidades de conservação que ainda precisam de alguma regularização somam cerca de 60 milhões de hectares.

Com tanta terra, se os processos de regularização utilizados em anos recentes – principalmente nos últimos quatro, durante a gestão Bolsonaro –, não forem modificados, serão necessários 1.170 anos para regularizar o passivo existente.

“Estamos tentando trazer luz para esse problema, para conseguirmos enfrentá-lo de maneira adequada. A gente, como sociedade, não deu a importância necessária para esse problema, que não é pequeno, é um problema grande, que vem crescendo e que se torna hoje a maior ameaça para as unidades de conservação, tanto em termos políticos como em termos jurídicos”, disse Warner Bento Filho, especialista em Políticas Públicas do WWF Brasil.

Falta de mão de obra

Para conseguir endereçar o problema, o ICMBio vai ter de superar muitos desafios, diz Eliani Maciel Lima, Coordenadora Geral de Consolidação Territorial do Instituto. A começar pelo número de pessoas que trabalham com o tema dentro do órgão.

Segundo ela, o setor da Consolidação Territorial tem hoje 44 funcionários, quando seriam necessários, no mínimo, 100.

“O principal gargalo que a gente tem e está desenhando estratégias para superar é a mão de obra. E essa mão de obra o ICMBio é carente em todas as áreas: para gestão de unidades, gestão administrativa e também para a regularização fundiária”, diz.

Diante da realidade, uma das propostas do órgão é usar recursos do fundo de compensação ambiental para contratação, por meio de editais, de serviços voltados à elaboração de cadeias dominiais, busca documental e cartorial, instrução, realização de georreferenciamento das áreas e avaliação e valoração dos imóveis.

“Hoje a gente tem feito isso com o nosso corpo técnico, que é mínimo, o que nos traz muita dificuldade. Não temos como precisar quantos funcionários seriam necessários, mas o que a gente está trabalhando é de ter um corpo de pelo menos 100 servidores que possam fazer essas atividades.”, diz.

Regularizar fundiariamente áreas de unidades de conservação não significa somente retirar e indenizar ocupantes de seu interior – quando legitimamente identificados como sendo detentores do direito de indenização. Este é apenas um pedacinho do trabalho. E o menor deles, na verdade.

Atualmente, a maior parte das terras fora do domínio do ICMBio não está sob titularidade de particulares, mas sim da própria União ou de unidades federativas. 

Segundo o Instituto, as áreas particulares representam apenas 8,7% do total (6,1 milhões de hectares). A maior parcela – 44% ou 30,8 milhões de hectares – são terras públicas federais e bens da União.

Em seguida, vêm as terras públicas estaduais – 10,4% ou 7,3 milhões de hectares – e as Terras Indígenas – 7,3% ou 5.1 milhões de hectares. 

Além disso, ainda existem 20,3 milhões de hectares – 29% – que são terras com dominialidade indefinida. 

Toda essa terra precisa ser arrecadada em nome do ICMBio, para que problemas tão básicos na gestão das unidades, como a criação e Implementação de Planos de Manejo, sejam efetivados.

“A falta de consolidação territorial afeta o manejo das unidades, com riscos à conservação das riquezas naturais, além de ferir o prazo legal de cinco anos para regularização das áreas”, diz o Ministério Público Federal, que trabalha com o ICMBio na busca de soluções para o problema.

Trabalho conjunto

O seminário realizado pelo ICMBio no final de novembro reuniu membros de oito organizações da sociedade civil dedicadas à proteção de áreas protegidas em diferentes biomas do país.

Também estiveram presentes representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do Ministério dos Povos Indígenas e do próprio Ministério do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, ao qual o órgão é subordinado.

Além da contratação de novos funcionários, os presentes apontaram outras soluções necessárias para resolução do problema, como a compatibilização dos sistemas utilizados pelos diferentes órgãos que trabalham com ordenamento territorial no país, direta ou indiretamente.

Isto é, INCRA, MMA, FUNAI e outros órgãos precisam falar, em termos técnicos, entre si. As certidões que o INCRA emite com a descrição do imóvel rural precisam poder ser acessadas pelo MMA na hora da validação do Cadastro Ambiental Rural, por exemplo. Hoje isso não acontece.

A integração com os sistemas estaduais de ordenamento territorial também é uma necessidade urgente. Como mostra ((o))eco no especial “Floresta de Ninguém”, 60% das terras ainda não destinadas na Amazônia estão nas mãos dos estados.

“A situação se complexifica ainda mais no âmbito dos estados, em que há legislação estadual específica que disciplina a matéria”, explica Douglas Montenegro, advogado da Rede Nacional Pró Unidades de Conservação, uma das organizações convidadas a participar do evento.

Segundo ele, há ainda outro problema na espinha dorsal da regularização fundiária de áreas protegidas e que precisa ser endereçado com urgência: a dificuldade de regularização documental dos imóveis. Isto é, separar quem tem posse de boa-fé, quem é grileiro, quem é proprietário e se a área estava ocupada antes da criação da UC.

Ramal secundário na região de Boca do Acre (AM). Foto: Marcio Isensee e Sá.

“Várias novas ideias foram apresentadas, por exemplo, a plataforma de negócios para compra e venda de imóveis; a contratação de servidores temporários para trabalhar especificamente na regularização fundiária; a criação de um cadastro para centralizar todas as informações; um mapa de prioridades entre aquelas UCs para as quais já há recurso para a indenização de proprietários. O que ficou evidente é que todos os participantes estão interessados na resolução da regularização fundiária de UCs, e o trabalho vai envolver não apenas o Poder Público, como também a sociedade civil”, explica Montenegro.

Segundo o WWF e a Rede Pró-UC, para zerar o passivo em 5 anos, a quantidade de área a ser regularizada anualmente dentro de Unidades de Conservação é de 12,3 milhões de hectares, ou uma área equivalente ao território de Portugal.

O desafio é enorme. Mas essencial para garantir que as unidades de conservação do país cumpram de fato sua função.

*Foto da capa: Lalo de Almeida / Folhapress

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site O Eco e são de total responsabilidade do autor.
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