Cravado na derradeira reserva de floresta primária do Pará, no município de Santarém, no oeste do estado, o Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande foi criado em 2005, concomitante ao início da operação da mineradora Alcoa na região, na cidade vizinha de Juruti, onde extrai bauxita.
O mineral é a matéria prima para a produção de alumínio. O processo de licenciamento ambiental da mineradora foi marcado por inúmeras denúncias de imprecisões, o que alçou a situação à Justiça.
Na época, dois secretários do meio ambiente do estado do Pará foram responsabilizados juridicamente. E, para a garantia de direitos, os moradores de Juruti Velho realizaram um grande acampamento em área de interesse da empresa. O recurso foi usado para dá visibilidade sobre a situação e a abertura de diálogo com a empresa e a mediação com os ministérios públicos federal e estadual.
O PAE possui uma população estimada entre 35 a 40 mil pessoas. Ela está distribuída em 144 comunidades em um território de 250 mil hectares. A população do PAE é maior que a da maioria dos municípios do Brasil, que possui a média calculada em 20 mil pessoas.
Agricultura, extrativismos, turismo de base comunitária e outras atividades povoam o cotidiano do lugar. Até o presente momento os moradores aguardam a titulação coletiva.
Em uma década marcada pela pauta ambiental na agenda política nacional, a modalidade de PAE foi criada pela Portaria nº 268 no dia 23 de outubro de 1996. Quatro anos após a ECO-92, realizada no Rio de Janeiro.
A portaria define o PAE como “um assentamento destinado à exploração de área dotada de riquezas extrativas, através de atividades economicamente viáveis, socialmente justas e ecologicamente sustentáveis, a serem executadas pelas populações que ocupem ou venham ocupar as mencionadas áreas”.
A Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento Agroextrativista da Gleba do Lago Grande (Feagle) é a principal representação política. Nos últimos anos o assentamento tem sido palco de constantes tensões em diferentes dimensões, que passam por grilagem, assédio de madeireiros, garimpeiros e mineradoras. Trata-se de uma área de lagos sob a influência dos rios Amazonas, Tapajós e Arapiuns.
Edilson Figueira, vice-presidente do STTR de Santarém e morador do Lago Grande, explica que há inúmeros gargalos a serem superados, muitos deles sob a responsabilidade do Incra, onde constam: i) concluir a regularização fundiária e ambiental; ii) concluir a atualização e cadastro da RB (relação de beneficiários) e fazer a homologação; iii) concluir a identificação dos imóveis para saber o que é terra do Incra e o que é terra de particular ou fazer; iv) realizar análise da cadeia dominial dos imóveis; v) realizar georreferenciamento; vi) realizar atualização do CAR (Cadastro Ambiental Rural); e, com vii) vistas a realizar a desintrusão de quem não tem perfil para residir no PAE.
Ivete Bastos, moradora do PAE e presidente do STTR de Santarém, informa que o drama da exploração ilegal de madeira de lei impregna o território. Sobre as modalidades de madeira na região, ela destaca Itaúba, Angelim, Cedro, Cupiúba, Jarana e Ipê.
Bastos esclarece que as comunidades utilizam as madeiras para as suas necessidades básicas, como a construção de casas, canoas, remos e móveis. A dirigente informa que a construção da estrada que liga a comunidade de Aninduba à Juruti tem incentivado o fluxo de drogas no assentamento. O PAE também vive sob o assédio da mineradora Alcoa. A questão foi judicializada no Ministério Público Federal, em 2018.
No delicado cenário do PAE, assim como em boa parte da Amazônia, a questão fundiária representa um nó. Ela empareda o desenvolvimento de projetos, acesso a créditos, e, por tabela, turbina uma infinidade de situações de conflitos dos mais variados matizes. E, ainda, pressão sobre as riquezas e ações de construção de portos, exploração ilegal de madeira e ameaças de morte, como é o caso do estudante Darlon Neres.

Darlon, por conta de sua militância, ele tem sido perseguido por um grupo de madeireiros.
(Foto: @menino_dobemviver).
O morador da comunidade Cabeceira do Marco e estudante do curso de Pedagogia da UFOPA (Universidade Federal do Oeste do Pará), Neres é um dos animadores do coletivo de jovens do PAE intitulado Guardiões do Bem Viver.
Ele acaba de vencer o concurso Quem faz a esperança florescer, do bioma Amazônia, organizado pela plataforma Chico Vive. Por conta de sua militância, ele tem sido perseguido por um grupo de madeireiros. Em setembro de 2023 o grupo de madeireiros foi à casa da família do jovem ambientalista para intimidá-lo. Os idosos ficaram temerosos pela integridade do universitário.
Para os defensores do meio ambiente nestas paragens, sobreviver sob ameaças tem sido uma constante. Em março do mesmo ano, desta feita na região de Arapiuns, um pastor ameaçou de morte várias lideranças organizadas em defesa do meio ambiente, reforma agrária e direitos humanos. Recentemente tem-se o registro de ameaças aos indígenas da área Maró, como noticiado no site Tapajós de Fato.
Em março de 2023, Auricélia Arapyun, coordenadora do Conselho Indígena Tapajós Arapiuns (CITA), Ivete Bastos e Edilson Silveirae Maria José, presidenta da Tapajoara (uma espécie de central das associações da Resex do Arapiuns) foram ameaçadas de morte por defenderem o direito a Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) no território da Reserva Extrativista Tapajós e Arapiuns. O áudio com as intimidações circulou em redes sociais.
Reportagem do site Amazônia Real esclarece que a ameaça foi distribuída pelo extrativista e pastor conhecido como Eldo, por ironia, filiado à Igreja da Paz, onde ele afirma que: “eu falei pra ela que se ela não cumprisse com a palavra dela, eu ia meter um projétil no miolo dela pra ela respeitar”.
A mesma reportagem informa que a ameaça é dirigida a Maria José Caetano Maitapu, indígena do povo Maitapu do Alto Rio Tapajós e atual presidente da Associação Tapajoara. Uma espécie de central das associações da Reserva Extrativista Arapiuns, que agrupa 85 entidades. Em seguida ele cita os demais dirigentes, a exemplo de Ivete do STTR.
Por conta destes cenários, o PAE soma 20 pessoas ameaçadas de morte, dados sistematizados pelo STTR.
| Pessoas ameaçadas de morte no PAE (Projeto de Assentamento Agroextrativista) Lago Grande, Santarém/PA | ||
| Nome | Comunidade | |
| 01 | Osvaldo Lima da Silveira | Retiro |
| 02 | Diego do Rosário e Silva | Retiro |
| 03 | Ronald Soares da Silva | Retiro |
| 04 | Alexandre Daniel do Rosário | Bom Jardim |
| 05 | Valdinho Nogueira | Bom Jardim |
| 06 | Janete Maria Branco | Terra Preta dos Viana |
| 07 | Darlon Neres | Cabeceira do Marco |
| 08 | Rosenilce dos Santos Vitor | Maranhão |
| 09 | Edilson Silveira Figueira | Maranhão |
| 10 | Raimunda L. da Costa Nunes | Igarapé Açu |
| 11 | Ricardo dos Santos Aires | Membeca |
| 12 | Ivete Bastos dos Santos | Dourado |
| 13 | Antônio Oliveira de Andrade | Aninduba/Bom Futuro |
| 14 | Siandre da Silva Batista | Vila Curuai |
| 15 | Darleilson de Sousa Mota | São José II |
| 16 | Osmarc dos Santos Sousa | Vila Gorete |
| 17 | Luziete da Silva Correa | Coroca |
| 18 | Sandrielem Correa Vieira | Coroca |
| 19 | Gildson Santos Braga | Coroca |
| 20 | Eliana da Silva Batista | Nazário |
Fonte: Sindicato dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais de Santarém/PA, outubro de 2025.
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