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O clima dos dados: desafios de monitorar os territórios

O clima dos dados: desafios de monitorar os territórios

A favela do Acari, localizada na Zona Norte do Rio, é uma dos territórios afetados por um dos maiores desafios da crise climática nas favelas e periferias: as enchentes que levam tudo de quem menos tem. Nas fortes chuvas de 2024, que deixaram 13 mortos na Região Metropolitana do Rio, mais de 20 mil moradores de Acari ficaram sem casas. Relembrar os impactos como os que ocorreram com os moradores do Acari é importante para iniciarmos uma reflexão sobre como e quais dados estão sendo coletados, analisados e usados para elaboração de medidas e políticas públicas que impeçam a repetição de tragédias anunciadas como esta. 

O monitoramento é um dos braços que a Casa Fluminense utiliza no seu trabalho na luta por justiça social. Sabemos que é a partir de dados qualificados que se constrói mudanças estruturais mas, no Brasil sofremos com a ausência de dados – um problema que vai da quantidade à qualidade de informações abertas que possuímos. 

Voltando a favela do Acari, após essas chuvas devastadoras em janeiro de 2024, elaboramos um mapeamento que identificou todos os lares da Região Metropolitana do Rio que estão localizados em áreas de alto risco de inundações e/ou deslizamentos. Para construir este mapa, que está aberto e disponível para todos, utilizamos informações públicas. Ou seja, este mapa feito a partir do monitoramento cidadão poderia ser uma ferramenta já utilizada por gestões públicas para antecipar suas ações, identificando os territórios com mais chances de serem atingidos durante as fortes chuvas, cada vez mais constantes com a crise climática. Além de mapear as áreas de alto risco, identificar as casas e regiões, seria possível também saber a cor, gênero, quantidade de crianças, situação econômica entre outras informações desses moradores. Mas há uma ausência de dados mais que colocada em nosso país, essa falta de informação é ainda mais presente –  na sua ausência histórica – para alguns grupos de pessoas, territórios e temáticas. 

O obstáculo de raspagem fica ainda maior para quem tem compromisso com a interseccionalidade, aqueles que buscam analisar os dados a partir de um conjunto de diferentes variáveis como raça, gênero, classe e território. Ao buscar informações sobre a cobertura básica para a população trans, por exemplo, não é possível identificá-la nas bases de dados disponíveis (por isso estamos criando a nossa, participe). A ausência desses registros compromete o acesso a direitos e resulta na negação da atenção básica a essa população. Integrar diferentes dados para, por exemplo, quantificar os grupos mais afetados com a crise climática foi um dos desafios que encontramos na elaboração do Cobradô – uma plataforma aberta, interativa, descomplicada e informativa que apresenta dados e análises atualizados sobre a Agenda Rio 2030. 

Lançamos esta nova plataforma que busca contribuir no monitoramento cidadão na Região Metropolitana do Rio de Janeiro durante a semana do meio ambiente, em junho. Para isso reorganizamos dados públicos, usamos a metodologia GCD (Geração Cidadã de Dados) e fizemos pedidos de Lei de Acesso à Informação (LAI) mas em todas dessas diferentes ferramentas lidamos com a dificuldade de encontrar informações básicas para a elaboração de políticas públicas urgentes frente ao contexto atual como, por exemplo, a quantidade de casas que estão em áreas de deslizamentos e inundações, escolas localizadas em ilhas de calor, projeção de pessoas que podem ser afetadas com desastres nos próximos anos entre outras questões que já estamos monitorando. 

Em um estado tão desigual, em um contexto inegável de racismo ambiental e injustiça climática, como as gestões públicas vão elaborar seus planos de adaptação e mitigação sem os critérios de raças, gênero e áreas mais afetadas? Sem mapeamentos das áreas das cidades que são ilhas de calor ou das regiões mais propícias a deslizamentos? E mais importante ainda, sem saber quem são os moradores dessas casas que já enfrentam constantemente as enchentes. 

Atualmente, apenas de 61% dos municípios brasileiros contam com um instituto de pesquisa e planejamento – órgãos fundamentais para a produção de estudos e dados que subsidiam a formulação, avaliação e aprimoramento de políticas públicas, orientando decisões estratégicas voltadas ao desenvolvimento social, econômico e territorial. Na Região Metropolitana do Rio apenas 3 dos 22 municípios possuem um órgão público olhando para dados locais. 

O Cobradô aponta que, se nada mudar até 2030, é possível que ocorra um aumento de apenas 7% no nível de transparência das gestões municipais da Região Metropolitana do Rio. O controle e participação social depende da produção e do acesso a informações. Essa negligência com os dados – sobretudo aqueles que dizem respeito às condições básicas de vida da população – compromete a formulação de políticas públicas eficazes, dificultando tanto sua melhoria quanto sua chegada a quem mais precisa. 

É importante destacar que a dificuldade de acesso a essas informações não é responsabilidade de quem busca os dados, mas sim reflexo de uma falta de prioridade histórica na produção e disponibilização de informações públicas de qualidade. O que mais a ausência desses dados está nos negando?

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site O Eco e são de total responsabilidade do autor.
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