A mobilização faz parte da Semana Camponesa em todo o país para denunciar a lentidão do governo federal na retomada efetiva da reforma agrária. A execução orçamentária segue travada (Foto: MST-PA).
Belém (PA) – No segundo dia de mobilização da Semana Nacional Camponesa, cerca de 400 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) permanecem ocupando o prédio do Banco do Brasil no centro da capital do Pará. A mobilização, que começou na segunda-feira (21), acontece em diversos estados do país. O objetivo é chamar a atenção para a paralisação da reforma agrária e reivindicar acesso a crédito, assistência técnica, infraestrutura e políticas públicas eficazes para as famílias acampadas e assentadas, sobretudo na região amazônica.
A Semana Nacional Camponesa ocorre em um contexto de recrudescimento da violência no campo, avanço do agronegócio predatório e lentidão na execução de políticas de democratização da terra. Segundo dados do MST, mais de 100 mil famílias estão acampadas no Brasil, vivendo em condições precárias à espera de regularização fundiária. Dessas, cerca de 65 mil esperam há mais de 10 anos por uma solução definitiva. Na região Norte, esse quadro é ainda mais dramático, com grandes extensões de terras públicas passíveis de destinação para a reforma agrária sendo disputadas por grileiros, madeireiras e grandes projetos agroindustriais.
A escolha do Banco do Brasil como alvo da ocupação não é aleatória: a instituição é responsável por operacionalizar programas como o PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), principal linha de crédito para pequenos produtores rurais. Embora o programa tenha sido retomado com mais força no atual governo, a burocracia, a exclusão digital e os critérios restritivos têm dificultado o acesso de assentados e assentadas, sobretudo na Amazônia, onde faltam agências bancárias, internet, técnicos e informações acessíveis.
Além do crédito, o MST exige investimentos públicos em infraestrutura básica (estradas vicinais, energia elétrica, habitação rural, saneamento), ampliação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), segurança jurídica para os territórios conquistados e a destinação de áreas públicas improdutivas e griladas para a reforma agrária.
A luta do movimento encontra respaldo em dados concretos. De acordo com o Censo Agropecuário de 2017, a agricultura familiar representa 77% dos estabelecimentos rurais no Brasil, embora ocupe apenas 23% da área total produtiva. Ainda assim, é responsável por aproximadamente 70% dos alimentos que chegam às mesas dos brasileiros, incluindo feijão, arroz, mandioca, leite, hortaliças e frutas. Além disso, emprega cerca de 67% da mão de obra no campo, mostrando sua importância estratégica para a segurança alimentar, o desenvolvimento local e a geração de empregos.
Apesar disso, a concentração de recursos segue privilegiando o agronegócio exportador, que, mesmo com menor empregabilidade e impacto ambiental mais severo, recebe quase cinco vezes mais crédito rural. Para a safra 2023/2024, o governo federal liberou R$77,7 bilhões para o PRONAF, enquanto o agronegócio teve acesso a R$364,2 bilhões, segundo dados do Ministério da Agricultura.
Na Amazônia Legal, onde se concentra boa parte dos conflitos agrários do país, os pequenos produtores e comunidades tradicionais são também os principais vetores da conservação ambiental. Experiências como o manejo comunitário de açaí, a extração sustentável da castanha-do-pará, a criação de peixes em tanques redes e a agroecologia demonstram que é possível produzir e conservar, contrariando o discurso de que o “progresso” só viria com o desmatamento e o avanço da soja e do gado.
O MST mantém hoje mais de 160 cooperativas e 120 agroindústrias, com foco em produção orgânica, comercialização direta e economia solidária, criando cadeias produtivas locais e alternativas reais ao modelo hegemônico. Segundo estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), assentamentos bem estruturados – com acesso a políticas públicas – apresentam melhores indicadores de escolaridade, renda, produtividade agrícola e segurança alimentar.
A Semana Camponesa também denuncia a lentidão do governo federal na retomada efetiva da reforma agrária. Embora o atual governo tenha sinalizado compromissos com os movimentos do campo, a execução orçamentária segue travada. O valor previsto para aquisição de terras em 2025 é de apenas R$1,2 bilhão, o que permitiria desapropriar uma quantidade irrisória de áreas frente ao passivo de famílias acampadas.
O movimento também reivindica a destinação imediata de terras públicas da União e do INCRA para assentamento de famílias; a universalização do acesso ao crédito agrícola e de custeio para assentados; a retomada e ampliação do PRONERA e de escolas do campo; a implementação efetiva do Plano Nacional de Redução de Agrotóxicos (PRONARA); a reativação do programa de habitação rural e obras de infraestrutura nos assentamentos.
“A ocupação do Banco do Brasil em Belém é parte de uma agenda de mobilizações em todo o país, cujo lema central é a luta por terra, teto, crédito e dignidade no campo. Em um cenário de crise climática, insegurança alimentar crescente e desigualdade, o fortalecimento da agricultura familiar e da reforma agrária se coloca não apenas como uma pauta social, mas como estratégia de soberania nacional e transição ecológica”, afirma Pablo Neri, coordenador geral do MST no Pará.
A resposta do governo federal e das instituições públicas será decisiva para o futuro de milhares de famílias que seguem produzindo sob condições adversas, resistindo à especulação fundiária, à grilagem e à violência no campo.
As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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