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Irmã do governador de Roraima é alvo da Polícia Federal

Irmã do governador de Roraima é alvo da Polícia Federal
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Agentes da PF mirou um esquema de lavagem de dinheiro do ouro e de cassiterita extraídos da Terra Indígena Yanomami, e foram até a casa de Vanda Garcia de Almeida, irmã de Antonio Denarium (PP); horas antes, governador de Roraima se reunia com representantes do garimpo ilegal (Foto: PF/Divulgação).


Boa Vista (RR) – A Polícia Federal (PF) deflagrou, desde a madrugada desta sexta-feira (10), uma operação contra lavagem de dinheiro em Roraima e um dos alvos foi Vanda Garcia de Almeida, irmã do governador Antonio Denarium (PP). Batizada de BAL, a operação mira um esquema que teria movimentado 64 milhões de reais nos últimos dois anos, dinheiro fruto do comércio do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami (TIY).

Ágil, a Secretaria de Comunicação do Governo de Roraima já informou que Denarium “recebeu a notícia da operação e desconhece o teor da investigação contra sua irmã, Vanda Garcia, e espera que as eventuais responsabilidades sejam apuradas na forma da lei”.

Os policiais foram à casa da irmã do governador no bairro de São Vicente, zona sul da capital Boa Vista. Em Roraima e também em Pernambuco, foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão e de bloqueio de bens, expedidos pela 4ª Vara Federal Criminal da Justiça Federal. Numa das casas, os agentes encontraram cinco toneladas de cassiterita, provavelmente extraída da TIY, segundo informou o portal G1.

De acordo com informações da PF, o esquema contaria com o uso de empresas de fachada, que procuravam “esquentar” o ouro por meio de pessoas que “receberiam valores de diversos financiadores pelo Brasil e sacariam ou transfeririam os valores para pessoas e empresas no estado de Roraima”. A operação foi batizada de BAL em alusão a um composto utilizado para tratar o envenenamento por ouro (British Anti-Lewsite).

A operação da PF se aproxima do círculo próximo do governador Denarium que, ao longo do seu primeiro mandato criou e aprovou leis – consideradas pela Justiça inconstitucionais – que beneficiaram os mineradores ilegais. Ele integra uma tropa de choque pró-garimpo no estado de Roraima. Nesta quinta-feira (09), no mesmo dia em que participou de um sobrevoo sobre a região do Surucucu, na TIY, acompanhando a comitiva interministerial do governo federal, Denarium se reuniu reservadamente com garimpeiros.

Em 2019, o filho de Vanda, Samuel Garcia de Oliveira, foi nomeado por seu tio, o governador Denarium, chefe da Divisão de Espaços Culturais da Secult, secretaria que é interinamente gerida por Leila de Souza Perussolo, titular da Secretaria de Educação. O salário é de R$ 2,6 mil. Leila é cunhada de Denarium.

Governador Denarium (quarto da esq. pra direita) com representantes dos garimpeiros e comandantes da operação de retirada (Foto: Divulgação)

Eram 18h40 desta quinta quando o governador de Roraima chegou à Base Aérea de Boa Vista. Ele cumprimentou os nove representantes dos garimpeiros presentes, sendo três mulheres, duas delas adolescentes. A equipe do governo estava em um único veículo. Ainda na área externa, Denarium cumprimenta um a um, sem descer do carro, e informa quem vai participar da reunião: “além dele e do comandante da Base, coronel [Edison] Prola, secretário de Segurança Pública; coronel Miramilton [Goiano de Souza] comandante da Polícia Militar”. Da guarita até o auditório, alguns garimpeiros acompanharam o governador, no mesmo carro – a convite dele. A conversa foi a portas fechadas. A ação foi presenciada pela reportagem da Amazônia Real.

Até as 21h30, horário local de Roraima, a Secretaria de Comunicação do governo estadual negava à reportagem da Amazônia Real a existência da reunião. Meia hora depois, por ligação telefônica, confirmou a informação, dizendo que se tratava de um encontro para buscar uma solução para a retirada dos garimpeiros. O encontro ocorreu horas depois de uma manifestação na Praça do Centro Cívico na qual os garimpeiros elogiaram a gestão estadual e culparam o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelo fim do garimpo ilegal.

“A reunião com a Base Aérea foi só para discutir a questão de uma garantia de que as aeronaves poderiam voar até os locais onde estão as pessoas e voltar sem nenhum problema”, contou Jailson Mesquita, coordenador-político do Movimento Garimpo é Legal. 

“Com o governador estamos discutindo ajuda humanitária para levar alimentos para as pessoas que vão demorar para sair e ainda não tem uma data. Estamos discutindo isso.”

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, afirmou que a operação de desintrusão da TIY pode durar um ano.

Ação pró-garimpo

O governador de Roraima Antônio Denarium chega à Base Aérea de Boa Vista para reunião com os representantes de garimpeiros e da FAB (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)

Denarium e os senadores foram convidados para a reunião que os garimpeiros passaram a semana divulgando nas redes sociais como “audiência pública”. A Praça do Centro Cívico, onde foi montada uma tenda para o encontro, abriga o Monumento ao Garimpeiro e as sedes dos Três Poderes do estado. Garimpeiros, advogados e líderes de associações e familiares discursaram. Inúmeras vezes os garimpeiros agradeceram o apoio de Denarium e citaram também Mecias de Jesus (Republicano), Chico Rodrigues (PSB) e Hiran Gonçalves (PP) como políticos que apoiam os garimpeiros. 

Por volta de 16h desta quinta, cerca de 200 garimpeiros e familiares fizeram uma reunião esvaziada em Boa Vista. Alguns deles fugiram recentemente da TIY. Nesse encontro, eles não demonstraram remorso ou qualquer preocupação com a situação de saúde do povo indígena. Mas pediram ajuda para a saída das áreas de garimpo.

“Tudo que nós queremos agora é arrancar nossos irmãos de lá”, disse Jailson durante o ato na tarde de quinta-feira. Também foram pautas do encontro “excessos”, como afirmam os garimpeiros, por parte da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) durante a operação que iniciou o desmontou do garimpo ilegal.

Dois vereadores de Boa Vista discursaram. “Nós estamos de portas abertas [na Câmara de Vereadores] para discutir esse assunto, para ver os impactos, para ver o que a gente pode fazer para melhorar a vida dessas pessoas que estão retornando”, disse o subtenente do Exército Brasileiro, Velton Quincoze Poleto (União Brasil).

Zélio Mota (MDB) vereador de Boa Vista, líder da prefeitura na Câmara, disse estar preocupado porque “essas 20 mil pessoas vindo para a capital, a capital sofrerá os impactos dessas pessoas vindo pra cá desempregadas, teremos impactos na questão da saúde pública, na educação, dentre todos os meios de prestação de serviços do município”.

Os manifestantes usaram bandeiras com a frase: “Roraima pede socorro”. Outras vestiam camisas com afirmações: “Garimpo Sim”. Três viaturas da Força Nacional acompanharam o ato a 200 metros de distância.  

Os manifestantes também culparam a imprensa pelas denúncias do garimpo ilegal que provocou a crise sanitária na TIY. “É da Globo?”, questionavam para decidirem se concederiam entrevista. “Querem marginalizar esses heróis brasileiros que merecem todo o respeito que veio povoar a Amazônia Brasileira”, discursou Cleiton Alves, líder do Movimento Garimpo é Legal.

“10 mil reais por mês”

  • Cleiton Alves, líder do Movimento Garimpo é Legal na reunião de garimpeiros na Praça do Centro Cívico em Boa Vista (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)
  • Reunião de garimpeiros e seus representantes na Praça do Centro Cívico em Boa Vista na tarde de quinta-feira (09/02) (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)

O garimpeiro Denilson Ferreira, de 30 anos, estava há quatro meses na região chamada de Pupunha, em Mucajaí, município a 57 quilômetros de Boa Vista. O acesso, segundo ele, é só de avião. Na terça-feira (7), ele chegou à capital depois de pagar 4 mil reais entre voos de helicóptero, embarcações e caminhadas mata a dentro. “Pagamos para deixar nós aqui. Lá não tem peixe, não tem nada”, disse, afirmando ter passado fome.

A Amazônia Real esteve na Vila Resilandia e Novo Paredão, em Alto Alegre. Da região que é um entreposto onde é negociado o Ouro de Sangue Yanomami, como a agência denunciou em uma série de reportagens, até Boa Vista, a viagem custa a partir de 1,2 mil reais. Os garimpeiros chegam de barco ao porto clandestino do Rio Uraricoera e depois precisam enfrentar 36 quilômetros até a sede da vila. Nesse local, dezenas de carros já estão à espera. Outros com tração 4×4 circulam com carrotes (cheios e vazios) de combustíveis nas carrocerias.

A cozinheira de garimpo na região do Parima, que fica dentro da TIY no município de Alto Alegre, Maria Aparecida dos Santos Souza, de 48 anos, trabalha com a mineração ilegal há 15. Durante a reunião da quinta, ela informou: “Tem mais ou menos dez dias que eu cheguei”. “Ganho 20, ganho 10 [gramas], depende. Dá 10 mil [reais], dá 12, dá 6 por mês”, contou quanto era o seu lucro. 

Uma dona de máquinas para garimpo, que se identificou como Baby Oliveira, informou que “os garimpeiros vêm de todos os estados, não é só de Roraima”. A mulher de 23 anos é natural do Amazonas e há dois trabalha na TIY. “No início eu investi o que não tinha. Investi o que não tinha, comecei do zero com muita humildade, mas o investimento que eu tenho lá hoje, no dia de hoje, é de mais de 450 mil [reais] em máquinas, motores”. 

Maria Aparecida Souza (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real)

A pouca idade chama atenção da mulher, que se apresenta como empresária do garimpo e assumiu que sabia ser proibido minerar dentro do território indígena Yanomami. Ela não quis responder à pergunta sobre os motivos que a fez entrar em uma área proibida.

“Descendo já eles [policiais] não deixam as pessoas trazer nada. Tomam o ouro, tomam a comida”, contou Geanne Moraes dos Santos (38), cozinheira no garimpo desde 2017. “Eu vim de canoa [pelo rio Uraricoera], tem uns 15 dias”. O marido dela continua no garimpo.

As operações de desintrusão da TIY continuam. Até a última segunda-feira, o espaço aéreo dentro da região voltou a ser liberado para que aeronaves possam transportar os garimpeiros e mineradores para fora do território indígena. Nesta quinta, o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, sobrevoou o local e disse que a crise humanitária do povo Yanomami é complexa.

“Lá de cima deu para ver um pouco do tamanho da destruição causada pelo garimpo ilegal. Será desafiador chegar a uma solução para esse problema que, de fato, é bastante sério, mas vamos trabalhar junto com os outros ministérios para resolver o mais rápido possível”, afirmou o ministro ao voltar para a base aérea em Boa Vista.

Os ministros que fazem parte da comitiva interministerial não puderam pousar na TIY devido às condições climáticas. O voo foi realizado sobre as áreas localizadas em Alto Mucajaí, Paa Piu, Hakoma e Surucucu. O governador Denarium também participou desse sobrevoo com as autoridades federais.


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