A região Trans-Purus, inclusive na rota da planejada rodovia AM-366, é o local do maior área no país de florestas públicas não destinadas, conhecidas como “terras devolutas” (Figura 10). Esta é a categoria de terra que é mais procurada por grileiros [1-4].
As florestas públicas não destinadas estão sendo invadidas, desmatadas e queimadas na BR-319 (Figura 11). Isto ocorre junto com grilagem desenfreada ao longo da BR-319 [6, 7].
Pequenos agricultores, inclusive sem-terras organizados, também procuram florestas não destinadas, como mostrado pela história da vila Realidade. Há risco dessas áreas serem destinadas para assentar esses atores, dada a afirmação do Presidente Lula de que ele quer criar uma “prateleira” de terras para distruibição, explicitamente incluíndo “terras devolutas” [9, 10]. Infelizmente, isto encoraja ainda mais invasão e mais desmatamento, como demonstrado pela história da Vila Realidade. As afirmações do presidente sobre a legalização de invasões e reivindicações de terra em florestas públicas é uma das grandes preocupações com relação ao impacto da BR-319 [11]. Este autor acredita que, no mínimo na área da BR-319 e a região Trans-Purus, a melhor solução é de cancelar todas as reivindicações do CAR em terras públicas e transformar as florestas públicas em unidades de conservação que não sejam APAs.
É provável que a abertura da AM-366 seria aproveitada pelos os grandes grileiros. Estes já estão reivindicando terras no Cadastro Ambiental Rural (CAR) ao longo deste trajeto (Figura 12). A grande potencial para desmatamento deste grupo é ilustrada pela história recente do sul do município de Lábrea [12]. Esta leva a grandes áreas de pastagens.
Chagas, um sociólogo da Universidade Federal de Rondônia (Unir) que estuda os atores do agronegócio na região AMACRO, eles estão planejando expandir as suas atividades para a região Trans-Purus [13]. Este grupo economicamente poderoso provavelmente compraria as terras griladas pelo grupo anterior.
Em 2023 formou-se uma enorme mancha de fumaça sobre a BR-319 e grande parte da região Trans-Purus (Figura 13). Esta é um fenômeno novo, pois, diferente das áreas no Pará, Mato Grosso e Rondônia que costumam ter grandes manchas de fumaça na época das queimadas, esta área tem sido relativamente preservada. Observe-se também que as manchas de fumaça sobre o Pará e o Amazonas são separadas, indicando que a fumaça no Amazonas não foi transportada do Pará como afirmado pelo governador do Amazonas [14].
A imagem que abre este artigo mostra queimada em desmatamento na Gleba Abelhas, uma floresta pública não destinada federal localizada no município de Canutama, Amazonas, muito próxima da TI Juma (Foto: Marizilda Cruppe / Greenpeace).
[1] Azevedo-Ramos, C., P. Moutinho, V.L.S. da Arruda, C.C. Stabile, A. Alencar, I. Castro & J.P. Ribeiro. 2020. Lawless land in no man’s land: The undesignated public forests in the Brazilian Amazon. Land Use Policy 99: art. 104863.
[2] Brito, B., P. Barreto, A. Brandão, S. Baima & P.H. Gomes. 2019. Stimulus for land grabbing and deforestation in the Brazilian Amazon. Environmental Research Letters 14: art. 064018.
[3] Carrero, G.C., R.T. Walker, C.S. Simmons & P.M. Fearnside. 2022a. Land grabbing in the Brazilian Amazon: Stealing public land with government approval. Land Use Policy 120: art. 106133.
[4] Yanai, A.M., P.M.L.A. Graça, L.G. Ziccardi, M.I.S. Escada & P.M. Fearnside. 2022. Brazil’s Amazonian deforestation: The role of landholdings in undesignated public lands. Regional Environmental Change 22: art. 30.
[5] Carrero, C.C., C.S. Simmons & R.T. Walker. 2022b. The great Amazon land grab –how Brazil’s government is clearing the way for deforestation. The Conversation, 02 de fevereiro de 2022.
[6] Ferrante, L., M.B.T. Andrade & P.M. Fearnside. 2021a. Grilagem na rodovia BR-319: 4 –O escândalo do “Lote C”. Amazônia Real, 16 de agosto de 2021. https://amazoniareal.com.br/grilagem-na-rodovia-br-319-4-o-escandalo-do-lote-c/
[7] Ferrante, L., M.B.T Andrade & P.M. Fearnside, 2021b. Land grabbing on Brazil’s Highway BR-319 as a spearhead for Amazonian deforestation. Land Use Policy 108: art. 105559.
[8] Fearnside, P.M. 2023b. Lula e a rodovia BR-319. Amazônia Real, 24 de janeiro de 2023.
[9] Machado, R. 2023. Lula fala em criar “prateleiras” de terras improdutivas para evitar invasões. Folha de São Paulo, 27 de junho de 2023.
[10] Fearnside, P.M. 2023c. Lula e a questão fundiária na Amazônia. Amazônia Real, 17 de janeiro de 2023.
[11] Lima, W. 2023. Fumaça das queimadas no sul do Amazonas atinge Manaus. Amazônia Real, 01 de setembro de 2023. https://amazoniareal.com.br/fumaca-das-queimadas-atinge-manaus/
[12] Cabral, B.F., A.M. Yanai, P.M.L.A. Graça, M.I.S. Escada, C.M. de Almeida & P.M. Fearnside. 2024. Amazon deforestation: A dangerous future indicated by patterns and trajectories in a hotspot of forest destruction in Brazil. Journal of Environmental Management 354: art. 120354.
[13] Pontes, F. 2024. Após Amacro, agronegócio mira expansão de suas fronteiras para regiões intocadas da Amazônia. Varadouro, 02 de abril de 2024.
[14] Ferrante, L. & P.M. Fearnside. 2023. Picos de fumaça em Manaus não podem ser atribuídos às queimadas do Pará, como afirma o governo do Amazonas. Amazônia Real, 14 de novembro de 2023.
[15] Globo Rural. 2023. Fumaça de queimadas na Amazônia viaja mais de 4 mil km e atinge o RS. Globo Rural, 21 de setembro de 2023.
[16] Os textos desta série fazem parte de uma revisão de literatura
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