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Impactos da rodovia BR-319 - 4: destruição ambiental 

Impactos da rodovia BR-319 – 4: destruição ambiental 


A BR-319 tem enormes impactos ambientais além da estreita faixa de terra ao longo da própria estrada, a qual o EIA e quase toda a discussão política estão limitados. A omissão dos impactos mais amplos do projeto rodoviário é, certamente, a maior deficiência do processo de licenciamento até agora. A limitação da consideração à beira da estrada cria fortes ironias, como a recente divulgação pelo Ministro dos Transportes de um plano para 170 passagens para animais silvestres [1] como solução para o que seria o principal impacto da estrada, mas ignorando o contexto maior de uma rodovia que ameaça grande parte do que resta da floresta amazônica brasileira. 

A migração de atores e processos do hotspot de desmatamento AMACRO (Amazonas, Acre e Rondônia), que a BR-319 conecta a Manaus, afetaria todas as áreas que já estão conectadas a Manaus por rodovia, incluindo a margem direita do Rio Negro [2] e o distrito de Agropecuária da Zona Franca de Manaus (DAS) (Figura 4). Também afetaria Roraima [3, 4]. Roraima é notório como o estado amazônico com menor controle ambiental, e os principais políticos no estado até apoiam os garimpeiros na Terra Indígena Yanomami [5-7]. Os planos para a BR-319 não incluem nenhuma ação para controlar o desmatamento resultante em Roraima. 

Figura 4. Fazendas localizadas ~80 km ao norte de Manaus no DAS (Distrito Agropecuária da SUFRAMA) em volta das reservas do Projeto Dinâmica Biológico de Fragmentos Florestais (PDBFF), do INPA e o Smithsonian Institute. Cor de rosa indica pastagens e verde clara indica capoeira em pastagens abandonadas. Esta situtação representa um convite aberto para invasão por sem-terras. Toda esta área precisa ser convertidas urgentemente em uma unidade de conservação que não seja uma APA.

Projetos de alto impacto que seriam facilitados por uma melhor conexão com Manaus via BR-319 incluem algumas das perfurações de petróleo nas áreas para as quais os direitos de perfuração foram vendidos no leilão de “fim do mundo” em janeiro de 2024 [8] e o projeto “Área Sedi/ementar do Solimões” (Figura 5), onde as primeiras perfurações já foram vendidas para a petrolífera russa Rosneft [9, 10]. 

Figura 5. Projeto de gás e petróleo “Área Sedimentar do Solimões” [11], p. 65). Linhas verdes são locais já com levanamento císmico de gas e petróleo. Quadrados marrons são blocos de perferação (já vendidos para Rosneft). Fonte para estradas planejadas: ([12], Ver: [13, 14]).

A Vila Realidade, localizada na parte sul do “trecho do meio” da BR-319, é o maior foco de desmatamento neste trecho. A ocupação em massa começou com a chegada de dois ónibus de sem-terras organizados, e a vila seguiu crescendo rapidamente com a chegada de muitos migrantes individuais atraidas pelos boatos sobre a disponibilidade de terras [15, 16]. As terras publicas invadidas em volta da vila foram legalizadas pelo INCRA, e as invasões continuam expandindo além dessa área. Em 2018 a Vila Realidade foi bem descrita assim: “A poeirenta Realidade (AM) segue o ciclo de exploração descontrolada de madeira, que abre espaço para a grilagem e o desmatamento ilegal que precede a pecuária extensiva. A diferença é que a vila fica às margens da BR-319, que, se asfaltada, pode espalhar esse modelo de ocupação caótica a uma área da floresta maior que a Alemanha” [17]. Esta sequência é provável ocorrer na região Trans-Purus se a AM-366 for construída. O tamanho da mancha de desmatamento em volta da vila Realidade é áté comparável com o desmatamento em volta da cidade de Porto Velho, visível na parte inferior da imagem (Figura 6). 

Figura 6. Desmatamento irradiando da BR-319 em 2022. A estrada horizontal é a Transamazônica (BR-230) e a no sentido vertial é a BR-319. A grande mancha de desmatamento na BR-319 ao norte do entrocamento com a BR-230 é a área da Vila Realidade. Imagem da Global Forest Watch [18]. [19]


A foto que abre este artigo mostra um trecho da BR-319 interditado no município de Humaitá no Amazonas. ( Foto: Alberto César Araújo/ Amazônia Real/ Acervo 2007).


Notas

[1] Holanda, M. & R. Machado. 2024. Ministério dos Transportes quer BR-319 cercada e com 170 passagens para animais. Jornal de Brasília, 03 de abril de 2024. 

[2] Ramos, C.J.P., P.M.L.A. Graça & P.M. Fearnside. 2018. Deforestation dynamics on an Amazonian peri-urban frontier: Simulating the influence of the Rio Negro Bridge in Manaus, Brazil. Environmental Management 62(6): 1134-1149. 

[3] Barni, P.E., P.M. Fearnside & P.M.L.A. Graça. 2015. Simulating deforestation and carbon loss in Amazonia: impacts in Brazil’s Roraima state from reconstructing Highway BR-319 (Manaus-Porto Velho). Environmental Management 55(2): 259-278.

[4] Barni, P.E., P.M. Fearnside & P.M.L.A. Graça. 2018. Simulando desmatamento e perda de carbono na Amazônia: Impactos no Estado de Roraima devido à reconstrução da BR-319 (Manaus-Porto Velho). In: Oliveira, S.K.S. & Falcão, M.T. (Eds.). Roraima: e Diversidades. Editora da Universidade Estadual de Roraima (UERR), Boa Vista, Roraima. p. 154-173. 

[5] Carta Capital. 2023. Governador de Roraima nega desnutrição de Yanomamis e defende garimpeiros. Carta Capital, 30 de janeiro de 2023. 

[6] Medeiros, F. 2023. Irmã do governador de Roraima é alvo da Polícia Federal. Amazônia Real, 10 de fevereiro de 2023.

[7] Oliveira, C. 2023. Políticos de Roraima teriam ligação com garimpo, TSE nega exclusão de minuta golpista e mais. Governo afirmou que políticos de Roraima têm ligação com o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. de Fato, 08 de fevereiro de 2023.

[8] Fearnside, P.M. 2023a. O leilão do “Fim do Mundo” para exploração de gás e petróleo. Amazônia Real, 14 de dezembro de 2023. 

[9] Fearnside, P.M. 2020. Os riscos do projeto de gás e petróleo “Área Sedimentar do Solimões”. Amazônia Real, 12 de março de 2020. 

[10] Fearnside, P.M. 2022a. O interesse financeiro de Putin nas rodovias da Amazônia brasileira. Amazônia Real, 03 de maio de 2022.

[11] EPE (Empresa de Pesquisa Energética). 2020. Estudo Ambiental de Área Sedimentar na Bacia Terrestre do Solimões. Relatório SOL-EA-60–600.0010-RE-R0. Manaus and Rio de Janeiro: EPE.

[12] DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes). 2002. Mapa Rodoviário Amazonas. DNIT, Brasília, DF.

[13] Fearnside, P.M. 2022b, Amazon environmental services: Why Brazil’s Highway BR-319 is so damaging. Ambio 51: 1367–1370.

[14] Fearnside, P.M. 2022c. Por que a rodovia BR-319 é tão prejudicial. Amazônia Real. 

[15] Fearnside, P.M. & P.M.L.A. Graça. 2006. BR-319: Brazil’s Manaus-Porto Velho Highway and the potential impact of linking the arc of deforestation to central Amazonia. Environmental Management 38(5): 705-716. 

[16] Fearnside, P.M. & P.M.L.A. Graça. 2009. BR-319: A rodovia Manaus-Porto Velho e o impacto potencial de conectar o arco de desmatamento à Amazônia central. Novos Cadernos NAEA 12(1): 19-50.

[17] Maisonnave, F. & L. de Almeida. 2018. BR-319: Asfaltar ou não asfaltar? Folha de São Paulo, 04 de setembro de 2018.

[18] Guatelli. C. 2022. As Brazil starts repaving an Amazon highway, land grabbers get to work. Mongabay, 13 de outubro de 2022. 

[19] Os textos desta série fazem parte de uma revisão de literatura solicitada pelo Ministério do e Mudança do Clima. 

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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