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Impacto simulado da BR-319–5: Resultados

Impacto simulado da BR-319–5: Resultados


Por Jerfferson L. Santos, Aurora M. Yanai, Paulo M. L. A. Graça, Francis W. S. Correia e Philip M. Fearnside

Validação

A validação comparou o mapa de desmatamento simulado de 2021 com o desmatamento de 2021 obtido pelo mapeamento do PRODES em 2021, que é considerado referência para o desmatamento observado. Este método considera os valores do índice de similaridade de 50% suficientes para validação do modelo [1]. O valor do índice mínimo de similaridade obtido foi de 51% para o modelo de simulação em janela de 11 × 11 células. Como cada célula deste modelo corresponde a 100 × 100 m, a janela possui uma área de 1,21 km2.

Além da validação para 2021, os resultados foram comparados a um modelo nulo. No modelo nulo foram utilizados os mesmos mapas de entrada e taxas de transição, mas com os coeficientes de pesos de evidência definidos como zero, produzindo o resultado mostrado na Figura 5.

Figura 5: Resultados da validação para 2021 com similaridade mínima e com o modelo nulo, utilizando o método de decaimento constante.

Previsão de desmatamento para os anos 2050 e 2100

Nesta seção serão apresentados os resultados dos cenários, destacando as mudanças simuladas até 2050 e até 2100. Os resultados mostram que, para o desmatamento em BAU_1, há um aumento de 200,24% até 2050 e 607,42% até 2100, em relação ao observado no mapa PRODES para 2021. Para BAU_2 há um aumento de 224,12% até 2050 e 711,33% até 2100, para toda a área modelada, conforme mostra a Figura 6.

Figura 6: Evolução do desmatamento acumulado para o período de 2021 (A) a 2050 e 2100 nos cenários BAU_1 (B e C) e BAU_2 (D e E). Neste estudo, “não floresta” refere-se às áreas não consideradas pelo PRODES/INPE no cálculo do desmatamento na Amazônia (savanas, águas, afloramentos rochosos, etc.: http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/).

Para o cenário BAU_1 no interflúvio Madeira-Purus (Regiões 3 e 4) onde está localizada a rodovia BR-319, houve aumentos de 197,37% até 2050 e 600,95% até 2100 na Região 3 e aumentos de 241,08% até 2050 e 762,04% até 2100 nas Regiões 4. Principalmente para o trecho norte da rodovia BR-319 (Região 4, que possui maior área disponível para desmatamento) após a pavimentação (BAU_2) houve aumentos de 260,08% até 2050 e 843,65% até 2100.

Outra parte do Estado do Amazonas que chama a atenção é a região Trans-Purus, no centro do estado (Região 7). Isso se deve à possível construção da rodovia AM-366, que ligaria à BR-319 (BAU_2). O cenário BAU_2 mostra um aumento de 359,48% até 2050 e 1.458,91% até 2100 (Figura 7, painéis D e E).

Figura 7: Evolução do desmatamento acumulado para o período de 2021 (A) a 2050 e 2100, nos cenários BAU_1 (B e C) e BAU_2 (D e E) na Região 7 (Trans-Purus) como resultado da construção de rodovias AM- 366 e AM-248.

A Região 5 (BR-174 de Manaus até a divisa com o Estado de Roraima) teria um aumento de 225,36% até 2050 e 734,81% até 2100 devido à influência da reconstrução da BR-319 (BAU_2). Assim, para as regiões influenciadas pela rodovia BR-319 (Regiões 3, 4, 5 e 7), o desmatamento teria um aumento de aproximadamente 60% no BAU_2 (159.961,31 km2) em relação ao BAU_1 (99.959,97 km2). Os resultados para todas as regiões são mostrados na Tabela 2.

Tabela 2: Aumento do desmatamento acumulado por região e percentual de aumento do desmatamento acumulado no período simulado em relação a 2021.

As estradas desempenharam um papel importante na distribuição e dispersão do desmatamento ao longo do tempo no modelo proposto. A Figura 8 recorta a área de estudo para mostrar como o desmatamento evolui em torno das estradas simuladas para os anos 2050, 2060, 2070, 2080, 2090 e 2100. Segundo o modelo, um aglomerado de desmatamento acaba atraindo outro desmatamento, que pode ocorrer nas margens dos rios sem a presença de estradas. No entanto, grande parte do desmatamento é conduzida ao longo de estradas não oficiais que se ramificam das estradas oficiais (o padrão dessas estradas vicinais é chamado de “espinha de peixe”). Esse padrão se desenvolve ao longo das estradas que ligam as cidades ribeirinhas, como pode ser observado na evolução do desmatamento mostrado na Figura 8, corroborando os estudos de Castro et al. [3], Nepstad et al. [4], Barber et al. [5], Santos-Jr. et al. [6] e Fearnside [7, 8].

Figura 8: Evolução do desmatamento no entorno das estradas simuladas ao longo do tempo no cenário BAU_2. A figura mostra parte da região de influência da AM-366 (Trans-Purus).

Podemos observar que o desmatamento aumentou em todas as categorias de proteção (exceto nas áreas militares, que apresentam desmatamento muito baixo). Ao comparar o desmatamento de áreas protegidas em relação à perda total de floresta (dentro e fora de áreas protegidas) após 2021, pode-se observar um aumento do desmatamento em áreas protegidas em 2.153,60 km2 até 2050 no cenário BAU_1, e 28.656,73 km2 até 2100, correspondendo a 3,72% e 9,78%, respectivamente, em relação ao desmatamento total. No cenário BAU_2, o desmatamento nas áreas protegidas foi de 1.960,65 km2 em 2050 e 34.612,13 km2 em 2100, correspondendo a 2,73% e 9,80%, respectivamente, da área total desmatada.

Nas Terras Indígenas, o desmatamento projetado após 2021 foi de 1.042,81 km2 em 2050 e 19.911,23 km2 em 2100 para o cenário BAU_1, correspondendo a 1,80% e 6,79%, respectivamente, em relação ao desmatamento total. Para o cenário BAU_2, a área total de desmatamento em Terras Indígenas foi de 964,44 km2 em 2050 e 21.079,15 km2 em 2100, respectivamente, dos quais 1,34% e 5,97% da área total desmatada foram após 2021. Em relação à área total de áreas protegidas, o desmatamento chega a 0,52% até 2050 e 7,91% até 2100, no cenário BAU_1 e 0,48% da área total de áreas protegidas até 2050 e 9,08% e da área de Terras Indígenas até 2100 no cenário BAU_2. A Figura 9 apresenta a relação entre o desmatamento em áreas protegidas e não protegidas, mostrando a importância das áreas protegidas para a conservação das florestas na Amazônia.

Figura 9: Desmatamento em áreas protegidas (unidades de conservação e Terras Indígenas) e áreas não protegidas (projetos de assentamento não são considerados áreas protegidas).

Para os projetos de assentamento, de acordo com os resultados da projeção para o cenário BAU_1, o desmatamento ocorrido após 2021 foi de 16.897,26 km2 até 2050 e 48.407,66 km2 até 2100, correspondendo a 41,22% e 19,79%, respectivamente, em relação ao desmatamento fora das áreas protegidas. Para o cenário BAU_2, o desmatamento após 2021 foi de 21.660,76 km2 em 2050 e 57.334,82 km2, o que corresponde a 43,31% e 19,39%, respectivamente, em relação ao desmatamento total (excluindo áreas protegidas) (Figura 10). Em relação à área total dos assentamentos, o desmatamento chega a 22,76% até 2050 da área total dos assentamentos e 65,19% até 2100 no cenário BAU_1, e chega a 29,17% até 2050, e 77,21% até 2100 no cenário BAU_2. [9]

Figura 10: Desmatamento em áreas protegidas (unidades de conservação e Terras Indígenas) e áreas não protegidas (projetos de assentamento não são considerados áreas protegidas).

A imagem que abre este artigo, foi registrada no município de Humaitá (AM) em agosto de 2018, a imagem tem a seguinte legenda “Madeireira em Realidade, vila localizada na BR 319 se torna a nova fronteira para madeireiros de Rondônia. A cada dia, novos moradores chegam abrindo negócios, em busca de oportunidades na Amazônia” (Foto: Marcio Isansee e Sá/Amazônia Real).


Notas

[1] Soares-Filho, B., H. Rodrigues & M. Follador. 2013. Um método híbrido analítico-heurístico para calibrar modelos de mudança de uso da terra. Environmental Modelling & Software 43: 80-87.

[2] Santos, J.L., A.M. Yanai, P.M.L.A. Graça, F.W.S. Correia & P.M. Fearnside. 2023. Desmatamento na Amazônia: Impacto simulado da proposta reconstrução da rodovia BR-319 (tradução)

[3] Castro, E.R., R. Monteiro & C.P. Castro. 2004. Dinâmica de atores, uso da terra e desmatamento na rodovia Cuiabá-Santarém. Papers do NAEA, 13(179): art. 1158.

[4] Nepstad, D., C.M. Stickler & O.T. Almeida. 2006. Globalization of the Amazon Soy and Beef Industries: Opportunities for Conservation. Conservation Biology 20(6): 1595-1603. https://doi.org/10.1111/j.1523-1739.2006.00510.x

[5] Barber, C.P., M.A. Cochrane, C.M. Souza & W.F. Laurance. 2014. Roads, deforestation, and the mitigating effect of protected areas in the Amazon. Biological Conservation 177: 203-209. https://doi.org/10.1016/j.biocon.2014.07.004

[6] dos Santos-Junior, M.A., A.M. Yanai, F.O. Sousa-Junior, I.S. Freitas, H.P. Pinheiro, A.C.R. Oliveira, F.L. Silva, P.M.L.A. Graça & P.M. Fearnside. 2018. BR-319 como Propulsora de desmatamento: Simulando o Impacto da Rodovia Manaus-Porto Velho. Instituto de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (IDESAM). Manaus, Amazonas 56 pp.

[7] Fearnside, P.M. 2022. Como sempre, os negócios: o ressurgimento do desmatamento na Amazônia brasileira. pp. 363-368. In: Fearnside, P.M. (ed.) Destruição e Conservação da Floresta Amazônica. Vol. 1. Editora do INPA, Manaus, Amazonas. 368 pp.

[8] Fearnside, P.M. 2022. Uso da terra na Amazônia e as mudanças climáticas globais. pp. 21-38. In: Fearnside, P.M. (ed.) Destruição e Conservação da Floresta Amazônica. Vol. 1. Editora do INPA, Manaus, Amazonas. 368 pp.

[9] Este texto é uma tradução parcial de: Santos, J.L., A.M. Yanai, P.M.L.A. Graça, F.W.S. Correia & P.M. Fearnside. 2023. Amazon deforestation: Simulated impact of Brazil’s proposed BR-319 highway project. Environmental Monitoring and Assessment 195(10): art. 1217.

Sobre os autores

Jerfferson Lobato dos Santos é aluno de doutorado no programa de pós-graduação em Clima e Ambiente de UEA e INPA, orientado por Francis Wagner Correia e Philip Martin Fearnside. Possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal Rural da Amazônia (2003), graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Pará (2004) e mestrado em Agricultura no Trópico Úmido pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (2006). Atualmente é analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recusos Naturais Renováveis. Pesquisa interações clima-biosfera na Amazônia, com ênfase em modelagem do clima e do desmatamento.

Aurora Miho Yanai é pós-doutoranda no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) trabalhando com modelagem de desmatamento na região Trans-Purus. Ela tem mestrado e doutorado pelo Inpa em ciências de florestas tropicais e tem experiência na análise e modelagem de desmatamento no sul do Amazonas.

Paulo Maurício Lima de Alencastro Graça é doutor pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ele tem mestrado em ciências florestais pela Universidade de São Paulo, (USP-Esalq) e graduação em Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Ele é pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), atuando junto ao laboratório de agroecossistemas. Ele tem publicado artigos sobre mapeamento de exploração madeireira utilizando técnicas de sensoriamento remoto, modelagem espacial do uso da terra, impacto do desmatamento, e eficiência de queima de biomassa florestal, entre outros.

Francis Wagner Silva Correia possui graduação em Física pela Universidade Federal do Amazonas (1995), mestrado (2000) e doutorado (2005) em Meteorologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Atualmente é professor Associado do Curso de Graduação em Meteorologia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), e professor e orientador no Programa de Pós-graduação em Clima e Ambiente – CLIAMB (Universidade do Estado do Amazonas – / Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia). Tem experiência na área de Geociências, atuando principalmente nos temas de Modelagem Climática e Hidrológica, Modelagem da Interação Superfície e Atmosfera, Modelagem do Uso e Cobertura da Terra.

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 750 publicações científicas e mais de 700 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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