Futuro com educação empreendedora – Do Micro Ao Macro – CartaCapital

Caminhos para novas trajetórias de vida

Artigo de Bruno Quick e José Henrique Paim Fernandes

Uma constatação invariável quando se conversa com alunos do ensino médio é que eles temem pelo futuro profissional. Incertezas em relação à carreira, muitas das vezes ligadas à compreensão de que nenhuma delas se enquadra no seu “modo de ver o mundo”; e também o medo do desemprego, pois não percebem que os cursos os preparam para uma entrada rápida no mercado de trabalho. Essas são algumas menções que demonstram que os jovens precisam concluir a educação básica com uma perspectiva profissional mais concreta, e com habilidades para se inserir no mundo de trabalho.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Ensino Médio tem como foco estimular o protagonismo dos estudantes como cidadãos, oportunizando uma formação que ultrapassa a preparação para a entrada na universidade e na vida profissional e se volta para o seu pleno desenvolvimento como seres humanos dignos, éticos, conscientes, solidários, inclusivos. Para isso, a BNCC é orientada por dez competências, que formam um conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores que promovem a formação integral dos estudantes e que irão auxiliá-los na construção de sua autoestima, para que possam desenhar seus projetos de vida com autonomia e apoiados em altas expectativas, dos educadores sobre eles e deles sobre si mesmos.

Inovação trazida pelo Novo Ensino Médio, o chamado Projeto de Vida é uma unidade curricular que tem por objetivo possibilitar a orientação, o planejamento e a avaliação do percurso educacional dos estudantes em busca de sua realização pessoal e profissional. Para isso, estimula seu autoconhecimento e a reflexão sobre suas escolhas com autoria e protagonismo, gerando autonomia para que possam construir seus projetos de vida a partir da experiência de várias e inúmeras decisões. Nesse caminho, são desenvolvidas as competências para que tenham sucesso na construção de suas vidas.

Cada uma das competências da BNCC integra aspectos tanto cognitivos quanto socioemocionais, como pensamento crítico e científico, comunicação, autoconhecimento, argumentação, criatividade. Desse modo, a BNCC propõe a superação da tradicional divisão entre desenvolvimento intelectual e desenvolvimento emocional para defender o desenvolvimento integral dos jovens em suas diversas dimensões. São as competências socioemocionais que irão apoiá-los em sua maneira de sentir, pensar, reagir, e nas atitudes para se relacionar consigo mesmo e com os outros, estabelecer objetivos, enfrentar situações novas ou desafiadoras na vida pessoal e na vida profissional. E isso está ligado à promoção de uma educação empreendedora em diferentes dimensões.

Quando se fala em educação empreendedora, se pensa apenas em formar estudantes para que possam abrir suas empresas, se transformarem em pessoas de negócios. Só que a educação empreendedora pode e vai além disso, tem a ver com atitude e com engajamento social. Ela visa estimular no estudante o pensamento crítico, o protagonismo no seu projeto de vida, o desenvolvimento de atitudes e habilidades exigidas no mundo do trabalho no século XXI – competências essas que têm relação com as competências gerais presentes na Base Nacional Comum Curricular e se constituem essenciais ao desenvolvimento pessoal, à cidadania ativa, à inclusão social e à empregabilidade.

Ou seja, deve ser encarada como uma ferramenta a mais para auxiliar os jovens a criarem uma atitude proativa na construção de seu futuro, uma aliada no ensino médio e na educação técnica profissional para ajudar a casar os conteúdos dos currículos com as altas expectativas juvenis e preencher espaços que auxiliem na sua aprendizagem e formação integral. Para tal, é indispensável que professores e gestores escolares passem por formações, a fim de compreenderem as múltiplas dimensões da educação empreendedora. E na medida em que absorverem os seus princípios, estarão mais confiantes para introduzir novas metodologias, organizar os planos de aula ou, mesmo, revisar os projetos político-pedagógicos das escolas para transmiti-los aos jovens e ajudá-los a assumir uma atitude criativa e empreendedora diante da vida.

A relevância da atitude empreendedora tem sido consagrada em diversos países. Preocupada em formar os jovens europeus, a Comissão Europeia elaborou o estudo EntreComp, em que lista 15 competências a serem desenvolvidas e que fazem parte de um perfil empreendedor. Entre as competências estão “planejar e gerir”, “pensamento ético e sustentável”, “motivação e perseverança”, “trabalhar com os outros” e “valorizar ideias”.

Assim, considerando os objetivos do ensino médio e as exigências de qualidade na formação da juventude, é importante que os sistemas e redes de ensino e as escolas orientem seus currículos e projetos pedagógicos de modo a articular as demandas dos jovens em diálogo com os contextos locais e com os cenários nacional e internacional.

O futuro do trabalho depende desses avanços para que os projetos de vida sejam influenciados pelas novas experiências e aprendizados a partir da escola. Estudantes precisam ser estimulados a explorar seu imaginário e sonhos, a agregar competências digitais e a buscar caminhos inovadores para os desafios de um novo mundo profissional. Desenvolver novas competências para carreiras e formas de trabalhos que ainda não existem, é caminhos para uma nova trajetória significativa e sustentável.

Bruno Quick é diretor técnico nacional do Sebrae e José Henrique Paim Fernandes é ex-ministro da Educação e diretor de Desenvolvimento de Gestão Pública e Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV DGPE).