Manaus (AM) – Sob a mobilização nacional “Mulheres Vivas”, mulheres de todo o Brasil ocuparam as ruas no fim de semana contra o avanço da violência de gênero. Na Amazônia Legal, elas cobraram com urgência por proteção, leis mais rígidas diante dos feminicídios e a tipificação do crime de ódio contra a mulher nos processos judiciais. Diferente dos outros estados do país, os casos de feminicídios são invisibilizados na região que compreende os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Roraima, Rondônia, Pará e Tocantins.
A negligência e a impunidade são marcas de casos emblemáticos como o da policial militar Deusiane da Silva Pinheiro, jovem de 26 anos assassinada com um tiro na cabeça em 1º de abril de 2015, dentro do local onde trabalhava, a Companhia Fluvial do Batalhão Ambiental, no bairro Tarumã, zona oeste de Manaus (AM).
Outro caso de repercussão foi a morte da artista circense, a venezuelana Julieta Hernández, assassinada brutalmente por violência de gênero em dezembro de 2023, em Presidente Figueiredo (AM), mas o casal acusado pelo crime foi condenado por latrocínio e ocultação de cadáver. A Justiça não reconheceu o crime de feminicídio.
No Amazonas, os índices de violência letal contra mulheres, que incluem feminicídio e homicídio doloso feminino, são os mais elevados do estudo Cartografias da Violência na Amazônia, divulgado em dezembro de 2024 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com o Instituto Mãe Crioula, que analisou o cenário de violência na região em 2023.
Segundo o FBSP, a taxa no estado alcança 6,4 mortes a cada 100 mil mulheres, representando um aumento de 69% em relação à média nacional, que é de 3,8 por 100 mil.
Já a taxa de feminicídios nos municípios da Amazônia Legal foi de 1,8 para cada 100 mil mulheres, 30,8% superior à média nacional, que foi de 1,4 por 100 mil.
Entre os nove estados que compõem a região, Rondônia apresentou a maior taxa de feminicídio no último ano, de 3,0 mortes por 100 mil, seguido do Acre com taxa de 2,7 e Mato Grosso com taxa de 2,6. Apenas Roraima (0,9), Amazonas (1,1) e Pará (1,2) registraram taxas de feminicídio inferiores à média nacional, mas esta informação pode estar enviesada pela baixa notificação de feminicídios nestes estados, ou seja, do total de mortes violentas de mulheres, um percentual baixo foi classificado como tendo sido motivado por questões de gênero ou violência doméstica.
Em Roraima, por exemplo, apenas 9,1% de todos os assassinatos de mulheres foram classificados como feminicídio, no Amazonas 23,9% e, no Pará, 24,5%, enquanto a média nacional foi de 35,6%
Além do crescimento das denúncias na Amazônia, a brutalidade dos crimes cometidos na região preocupa. No Pará, duas mulheres quebradeiras de coco-babaçu sofreram feminicídio em Novo Repartimento, região sudeste paraense, dias antes da abertura da COP30. No dia 3 de novembro, Antônia Ferreira dos Santos, 53 anos, e Marly Viana Barroso, 71, foram brutalmente assassinadas, no que movimentos de mulheres qualificaram como feminicídio, com fortes indícios de violência de gênero, incluindo possíveis agressões sexuais e uso de arma branca.
A repercussão do crime entre organizações sociais e de direitos humanos foi intensificada pela proximidade da conferência da ONU sobre clima na Amazônia. No dia 11 de novembro, a Polícia Civil anunciou a prisão de Danilo Carneiro da Silva, que confessou o duplo homicídio. O caso passou a ser oficialmente tratado como feminicídio.
21 dias de Ativismo

Na capital amazonense, o movimento de mulheres já estava mobilizado desde a noite de sexta-feira (5), quando elas iniciaram uma vigília por justiça às vítimas de feminicídio e contra a impunidade nos processos judiciais que marcam esses casos. Como parte do movimento nacional “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher”, o Fórum Permanente de Mulheres de Manaus realizou a Vigília por Justiça para Deusiane Pinheiro e pelo Fim do Feminicídio em frente ao Fórum Ministro Henoch Reis. Entre velas, cartazes e emoção pelas vidas perdidas de tantas mulheres, as manifestantes reivindicaram por uma justiça efetiva no Amazonas.
O caso de Deusiane, que se arrasta há 10 anos, voltou a ferir as mulheres amazonenses em setembro deste ano, quando o Conselho Permanente de Justiça Militar do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) absolveu o réu Elson Santos de Brito do crime de homicídio. Outros quatro envolvidos, os militares Cosme Moura Sousa, Jairo Oliveira Gomes, Júlio Henrique da Silva Gama e Narcizio Guimarães Neto, que confirmaram a versão do sargento Elson, foram absolvidos por unanimidade do crime de falso testemunho. A decisão revoltou Antônia Assunção da Silva, mãe de Deusiane.

“São 10 anos que eu espero por justiça. Minha filha foi assassinada dentro de um batalhão ambiental. A polícia, em vez de punir o assassino, encobriu o assassino”, disse em entrevista à Amazônia Real. Ela cobrou pela responsabilização urgente dos assassinos de sua filha. “Quero ter voz para que a memória da minha filha não seja esquecida, que os assassinos não fiquem impunes para matar outras pessoas. Isso é inadmissível, se fala tanto de direitos de mulheres, mas esses direitos são violados todos os dias”, manifestou emocionada.
À época do crime, Elson dos Santos Brito disse em depoimento na Delegacia de Homicídios que a PM havia se suicidado e os colegas militares confirmaram a sua versão. O réu chegou a ser investigado por crime de feminicídio, mas durante a apuração o caso ficou tipificado como homicídio qualificado entre militares.
Luzanira Varela, integrante do Fórum Permanente das Mulheres de Manaus, atua há mais de 40 anos no enfrentamento à violência contra a mulher. Ela se dedica a acompanhar casos e apoiar famílias no Amazonas, como no feminicídio de Deusiane Pinheiro. Varela também cita outros julgamentos que marcaram o estado, como o caso da empresária Jerusa Nakime, assassinada por Ivan Rodrigues Chagas a golpes de faca, em abril de 2018, em Manaus. O agressor foi condenado a 27 anos de prisão pelo crime de feminicídio.
Para a feminista, a violência letal contra mulheres encontra terreno fértil na combinação entre a morosidade da justiça e uma sociedade machista e patriarcal, que naturaliza o controle sobre a vida das mulheres. “Os homens se sentiram à vontade para matar as mulheres, a morosidade no julgamento contribui”, afirma. Ela critica o que chama de “kit para matar a mulher e não ser preso”: bons antecedentes, endereço fixo e emprego, fatores que muitas vezes livram os agressores da prisão preventiva.

“O feminicídio é cruel. A mulher morre pela condição de ser mulher. Hoje tu está aqui, e amanhã um louco acha que é teu dono e tira a tua vida. A morosidade da justiça e também a sociedade machista e patriarcal que a gente vive precisa mudar. Enquanto a gente viver nessa sociedade, nós vamos continuar tendo muitas mulheres assassinadas”, declarou.
Apesar da dor e da luta, as feministas amazonenses tem esperança de que o caso de Deusiane Pinheiro não seja mais um a ficar na impunidade. O Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) anunciou que irá recorrer da decisão que absolveu os policiais militares acusados de envolvimento na morte da soldado. Além disso, a União Brasileira de Mulheres (UBM) registrou uma representação para que o caso seja federalizado.
“Estamos aguardando uma resposta positiva para que esse julgamento seja retirado das instâncias locais para ser julgado nacionalmente. Como é um julgamento militar, a gente sabe que a isenção não é 100%. Infelizmente, o tribunal militar não vai punir seus pares. A gente sabe que existe um corporativismo. Por esse motivo, solicitamos a federalização do caso para que não tenha vícios nesse julgamento e para que haja imparcialidade”, confirmou Eriana Azevedo, presidente da UBM no Amazonas.
O Levante no Brasil
Diante dos crimes brutais que tomaram os noticiários do país nas últimas semanas, as mulheres foram às ruas de várias capitais em protesto contra a violência que atinge meninas, mulheres e crianças. Segundo o movimento Levante Mulheres Vivas, houve convocação de atos em pelo menos 20 estados e no Distrito Federal.
Em São Paulo (SP), as manifestantes ocuparam a Avenida Paulista em revolta com um caso que chamou atenção nacional no dia 29 de novembro. Tainara Souza Santos, de 30 anos, foi vítima de uma tentativa brutal de feminicídio. Arrastada por um carro na Marginal Tietê, na zona norte de São Paulo, ela teve as duas pernas amputadas. Tainara está internada em estado grave. O agressor é Douglas Alves da Silva, de 26 anos. Ele está preso e é alvo de um inquérito policial.
No dia anterior (28/11), duas mulheres foram assassinadas após o ataque de um feminicida no Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) Celso Suckow da Fonseca, localizado no Maracanã, na zona norte do Rio de Janeiro (RJ). A diretora da equipe pedagógica Allane de Souza Pedrotti Matos, de 41 anos, e a psicóloga Layse Costa Pinheiro, de 40 anos, foram baleadas por João Antônio Miranda Tello Ramos Gonçalves, funcionário do Cefet que não aceitava ser chefiado por mulheres.
No Rio de Janeiro, a manifestação ocorreu na Avenida Atlântica, em Copacabana. Soma-se às violências no estado a tentativa de feminicídio contra Aline Nascimento, que na última quinta-feira (3) foi esfaqueada pelo ex-companheiro e socorrida às pressas em Irajá, zona Norte do Rio. Em Brasília (DF), a marcha ocorreu na Torre de TV, em meio a mais um caso recente de feminicídio. A cabo do Exército Maria de Lourdes Freire Matos, de 25 anos, foi assassinada a facadas e teve o corpo carbonizado pelo também militar Kelvin Barros da Silva, 21 anos. Ele confessou a autoria do crime e está preso no Batalhão da Polícia do Exército, em Brasília.
Entre as pautas centrais do movimento “Mulheres Vivas” está o reforço da Lei Maria da Penha e da legislação que combate o feminicídio no país. O marco inicial dessa proteção é a Lei nº 13.104/2015, que qualificou o assassinato de mulheres por razões de gênero como crime hediondo, alterando o artigo 121 do Código Penal. Em outubro de 2024, o Brasil avançou com a Lei nº 14.994, conhecida como “Pacote Antifeminicídio”, que transformou o feminicídio em um tipo penal autônomo e agravou a pena para a maior prevista no Código Penal, de até 40 anos, além incluir novas agravantes e endurecer dispositivos ligados à violência contra a mulher.
No ato realizado em Manaus, na Praça do Congresso, as mulheres realizaram fortes discursos que evocaram a memória de vítimas como Manuela Otto, artista e ativista mulher trans que foi assassinada a tiro à queima-roupa pelo policial militar Jeremias Costa Silva, em 2021. O PM foi condenado em julho do ano passado a apenas 10 anos de prisão em regime fechado,por homicídio “simples”. O ato foi conduzido com atrações culturais e o levantamento de bandeiras e faixas que pediam pelo fim da violência contra as mulheres.

Raiclicia Nayara, presidente do Movimento Baque Mulher em Manaus, afirmou que a união das mulheres neste momento de aumento dos crimes brutais quebra um ciclo vicioso de violência na região Norte. Segundo Nayara, as mulheres nortistas não encontram ajuda em suas denúncias.
“Nós temos uma cultura de violência forte na região, vários casos nos quais as mulheres são silenciadas quando elas tentam denunciar. Tem sido ineficiente a lei Maria da Penha na hora de acolher essas mulheres. A precisa mudar. Hoje as políticas públicas são uma maquiagem, elas estão ali só para dizer que tem, mas na hora de executar a lei, ela não está sendo realizada”, declarou.
Para Alderlene Pimentel, professora do curso de Geologia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e presidente da Associação Brasileira de Mulheres nas Geociências – Núcleo Manaus, é preciso também a equidade de gênero profissional como um dos fatores de proteção social para as mulheres.
“Mas, para isso acontecer, a gente precisa de uma evolução, da redução dos machismo, a gente precisa de uma melhoria estrutural com relação às legislações para as mulheres, principalmente para que haja punição para todo tipo de violência, seja violência física, emocional, feminicídios, violência psicológica. A gente precisa que haja realmente uma ação desses nossos legisladores para que a gente tenha mudanças. Nós queremos que todas as mulheres estejam vivas”, afirmou Pimentel.
Altos índices de violência
A pesquisa do Mapa Nacional da Violência de Gênero, realizada pelo DataSenado e divulgada em novembro deste ano, revelou que 3,7 milhões de mulheres sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar em 2025. O levantamento também apontou um dado preocupante: quase 6 em cada 10 mulheres relatam que as agressões ocorrem há menos de seis meses, enquanto 21% afirmam conviver com episódios há mais de um ano.
Em 2025, o Brasil já registra mais de 1.180 feminicídios, de acordo com o Ministério das Mulheres. No mesmo período, o Ligue 180 tem realizado quase 3 mil atendimentos por dia.

A violência se agrava no caso de mulheres negras. Em 2024, o Brasil bateu recorde na taxa de feminicídios desde que o crime foi tipificado em 2015, com um total de 1.492 casos, uma média de quatro assassinatos por dia, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A análise dos casos mostra que 63,6% das vítimas eram negras e 70,5% tinham entre 18 e 44 anos.
A maioria dos crimes ocorreu em contexto doméstico, com oito em cada dez mulheres assassinadas por companheiros ou ex-companheiros, e 64,3% dos homicídios aconteceram dentro de casa. Quase todas as vítimas, 97%, foram assassinadas por homens, evidenciando o caráter de violência de gênero desses crimes.
Deborah Criolla, pesquisadora, multiartista e coordenadora do Fórum da Juventude Negra do Amazonas (Fojune), ressaltou que as mulheres negras e jovens no Amazonas sofrem violência não só dentro de casa, mas principalmente violências estatais em consequência do racismo. A expectativa da ativista é de que o movimento consiga levantar políticas públicas para combater essas estatísticas e acabar com o ciclo de violência.
“Nós fazemos parte da maior taxa de violência obstétrica em números nacionais. É muito importante nossos corpos estarem aqui interagindo também com outros coletivos, com outras vivências, onde a gente se soma e vê que esse movimento não morreu. Também quero chamar atenção para as mulheres negras e mulheres indígenas do interior do Amazonas. No interior, tem altas taxas de estupros, tem altas taxas de união estável entre crianças e homens adultos”, disse a jovem.
Indígenas invisibilizadas
As mulheres indígenas enfrentam um cenário de violência extrema. Entre 2014 e 2023, os registros de agressões físicas, psicológicas e sexuais contra elas mais que triplicaram. Um levantamento inédito da Gênero e Número, divulgado este ano, aponta que os casos de violência contra mulheres indígenas aumentaram 258% em nove anos, bem acima da média nacional, que foi de 207% para brasileiras de todas as raças no mesmo período. Os dados foram extraídos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Ministério da Saúde, e referem-se a três formas de violência: física, psicológica e sexual.

As altas taxas evidenciam a vulnerabilidade particular dessa população frente à violência de gênero no país. Marinete Tukano, coordenadora da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB), reforçou que as mulheres indígenas são silenciadas ao denunciar as violações. Uma das principais dificuldades é encontrar registros oficiais sobre esse tipo de violência.
“Não estamos no sistema brasileiro como indígenas, mas como mulheres pardas. Estamos subnotificadas e as nossas mortes não são registradas, nossas violações de corpos não são registradas. Só é registrada e reconhecida as violações contra as mulheres indígenas quando vai para as mídias nacionais e quando não vai, elas são esquecidas”, disse.
A liderança indígena lembrou de um caso recente de violência sexual contra uma adolescente indígena do povo Kulina, de 12 anos. Ela foi vítima de estupro coletivo na comunidade Mapiranga no município de Juruá, interior do Amazonas. Segundo a Polícia Civil, ao menos oito adolescentes, todos do mesmo povo, já foram identificados como suspeitos de envolvimento no caso.
“Um dos acontecimentos são essas violências brutais contra as meninas e meninos indígenas dentro do território, que atinge também as mulheres indígenas que lideram e estão à frente das organizações indígenas. Portanto, o ato de hoje é um ato de resistência para que parem de nos matar, pelo de todas as violências contra nós mulheres pelo fim do feminicídio das mulheres indígenas”, declarou.
Os registros de violência sexual – que englobam casos de assédio, estupro, pornografia infantil e exploração sexual – saltaram para 297%. entre as mulheres indígenas. Já entre as brasileiras em geral, o aumento chegou a 188%. Metade das vítimas de violência sexual são meninas indígenas menores de 14 anos. No total, 79% das vítimas indígenas são menores de idade, versus 66% entre a população feminina em geral. Entre os agressores, os companheiros e ex-companheiros se destacam, um padrão que se repete em toda a população brasileira.
Socorro Baniwa, coordenadora executiva da Rede de Mulheres Indígenas do Estado do Amazonas – Makira E’ta, ressaltou que os casos de violência de gênero contra as mulheres e crianças indígenas, dentro ou fora das aldeias e das comunidades, não são isolados e acontecem de forma constante.

“As mulheres indígenas passam por várias violências, tanto dentro do território, quanto fora dele. E ainda assim, essa violência é apagada. Porque dentro dos registros das delegacias, não existe a etnia dessa mulher. Dentro dos territórios é pior. O feminicídio, o estupro de vulnerável, é crescente onde as políticas públicas de proteção, tanto para mulher, como para as crianças, ainda são precárias e não tem atenção diferenciada para nós. Estar aqui participando nesse momento é um ato mesmo de resistência contra à violência existente para nós enquanto mulheres indígenas”, disse.
Em janeiro de 2024, Raimundo Nonato Oliveira, tuxaua do povo Mura da aldeia Muratuba, na região do Lago do Acará, em Autazes, interior do Amazonas, foi preso pelo crime de estupro de vulnerável recorrente contra quatro mulheres, inclusive uma criança de oito anos. As vítimas pediram proteção, alegando correrem risco de vida na comunidade.
Também em janeiro de 2024, a Secretaria Municipal de Segurança Pública de Benjamin Constant, na região da tríplice fronteira – Brasil, Colômbia e Peru no Alto Solimões, no Amazonas, localizouos corpos de uma mãe, de 28 anos, e do filho, de 4 anos, ambos indígenas do povo Tikuna de nacionalidade colombiana. . A mulher tinha marcas de tiros no corpo e a criança teve o pescoço degolado.
Em 2023, durante a Marcha das Mulheres Indígenas, em Brasília, as mulheres lideranças denunciaram a violência de gênero que atravessa seus corpos. Um dos episódios mais violentos foi o assassinato de Maria Clara Batista, 15 anos, do povo Karipuna. Ela foi vítima de violência sexual na cidade de Oiapoque, no Amapá.
Em 2020, repercutiu o caso de violência sexual sofrida pela menina Ana Beatriz, de 5 anos, dentro de seu próprio território, na Terra Indígena Andirá Marau, do povo Sateré-Mawé. O estupro resultou em sua morte.
É preciso educar os homens

De acordo com a oficial de justiça Marília Freire, à frente do Coletivo Feminista Humaniza, o aumento da pena do crime de feminicídio para 40 anos é insuficiente quando se trata de diminuir o número de casos. O motivo é a criação dos homens, que se fundamenta em uma lógica machista e misógina de subjugação das mulheres.
“A gente tem que falar de educação desde a infância, tem que falar sobre qual masculinidade a gente está promovendo nas escolas, na televisão, em casa. Como é que as crianças estão sendo educadas? Porque a gente nunca vai ver uma mudança de quadro se a gente não começar a educar os homens”, explicou.
Além disso, Freire afirma que é preciso reforçar as políticas públicas de proteção. “Só a medida protetiva não vai resolver. Medida protetiva é um papel. Quantas mulheres são assassinadas estando com medida protetiva? Os agressores não respeitam, eles vão mesmo para aquilo que desejam, que é a morte de todas nós”, afirmou.

Em sua avaliação, também é necessário que as mulheres compreendam o ciclo de violência quando estão inseridas nele. Freire relata que, muito raramente, um caso de feminicídio acontece como o primeiro ato de violência. Mas, as mulheres custam a perceber quando estão sendo violentadas. Existe um motivo para isso também. As mulheres vulneráveis economicamente estão mais sujeitas à impossibilidade ou à dificuldade de sair do ciclo de violência.
“Passa por uma lua de mel, passa por um período de afastamento, depois vem as violências psicológicas, verbais, físicas. Para quem está dentro do ciclo é mais difícil se perceber, mas é preciso a gente falar disso. Aquilo que começa como uma agressão verbal, que acontece como um constrangimento público, que acontece às vezes como uma restrição de liberdade, vai subindo uma escada até chegar no feminicídio”, disse Marília.
A feminista defende que as mulheres precisam estar mais conectadas, em diálogo, para construir espaços seguros onde possam compartilhar o que estão passando e aceitar ajuda para seguir um caminho que não seja o da violência.
“A gente não sabe quando vai ser uma filha, uma irmã, uma amiga, uma prima, uma mãe. Às vezes a gente tem uma companheira que está muito perto passando por violência e a gente não sabe, não consegue ajudar. Todas essas atividades que estamos fazendo em conjunto querem reverberar para o Amazonas que as mulheres estão juntas, que a gente está enlutada, mas que a gente também está na luta. Não podemos deixar passar e nem normalizar a brutalidade e o crescimento das violências”.
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