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As savanas amazônicas são parte integrante do “bioma” Amazônia brasileiro –1: Introdução e resumo da série

As savanas amazônicas são parte integrante do “bioma” Amazônia brasileiro –1: Introdução e resumo da série


William Douglas Carvalho, Salustiano V. Costa-Neto, Fernando César Paiva Dagosta, Philip Martin Fearnside, Renato Richard Hilário, Hernani Fernandes Magalhães de Oliveira, Cláudia Regina da Silva, José Júlio de Toledo, Bruna Silva Xavier & Karen Mustin


Resumo

As políticas de conservação no Brasil diferem entre os “biomas” nos quais o país dividiu seu território desde 2004. O bioma Amazônia é predominantemente floresta tropical, mas também inclui ecossistemas de savana únicos, enquanto o bioma Cerrado é composto por vários tipos de savana, mas também inclui ilhas e corredores de floresta. A confusão, tanto inadvertida quanto deliberada, entre os termos Cerrado e “savana” resultou na redução da proteção das savanas amazônicas, permitindo a aplicação de requisitos menos exigentes aplicáveis ao bioma Cerrado. As ameaças às savanas amazônicas também são aumentadas por disposições legais que permitem que as reservas legais obrigatórias em propriedades privadas sejam compensadas por reservas em outras partes do mesmo bioma, sem exigir que sejam do mesmo tipo de ecossistema. Sugerimos os esclarecimentos e as mudanças necessárias nas regulamentações brasileiras para garantir a proteção dos ecossistemas únicos de savana amazônica do país.

Os “biomas” brasileiros

Existem várias definições do termo “bioma” nas ciências ecológicas, considerando diferentes fatores, características e escalas ecológicas [1]. Nas ciências ecológicas, o termo “bioma” não se limita a um único país e se refere à vegetação nativa existente (não a áreas que foram convertidas para outros usos); as definições variam quanto à inclusão de enclaves de outros tipos de vegetação. Segundo essas definições, a floresta amazônica faz parte do “bioma de floresta tropical”, que também inclui, por exemplo, florestas na África, Sudeste Asiático, América Central e leste do Brasil. Isso difere de como o termo tem sido usado no Brasil desde 2004, onde agora se refere a regiões do país onde a vegetação original predominante é ou era do tipo que dá nome ao bioma. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) definiu seis “biomas” terrestres: Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa e Pantanal [2].

Os limites dos “biomas” oficiais do Brasil são baseados em critérios ecológicos e biogeográficos, em vez de políticos [2]. Esses “biomas” são as regiões onde ocorre o planejamento sistemático e, desde 2004, têm sido usados para a maior parte das políticas governamentais (por exemplo, [3]). No entanto, no caso da Amazônia brasileira, existe uma segunda definição política: a “Amazônia Legal”. Desde a segunda metade do século XX, essa definição tem sido usada na principal peça da legislação ambiental brasileira que protege os ecossistemas nativos em terras privadas, a Lei Brasileira de Proteção à Vegetação Nativa (Lei nº 12.651/2012), com implicações importantes para a área total de vegetação nativa que deve, por lei, ser preservada em propriedades privadas [4, 5]. Essa lei estabelece regras gerais para a proteção da vegetação nativa, bem como para a exploração florestal e o controle e prevenção de incêndios florestais (ver [4, 5]).

A Amazônia Legal foi declarada em 1953, e aproximadamente um quarto de sua área abrange parte do que posteriormente foi definido como o bioma Cerrado do Brasil Central, bem como uma pequena parte do bioma Pantanal, a área restante da Amazônia Legal sendo composta pelo bioma Amazônia (Fig. 1 —[2, 6]). Portanto, dependendo do conceito utilizado nas políticas governamentais, os limites entre a “Amazônia” e outras regiões podem ser bastante diferentes, e aqui argumentamos que isso pode ter consequências diretas para a conservação da biodiversidade no Brasil [7].

Figura 1. Mapas mostrando os seis biomas terrestres brasileiros e a Amazônia Legal em relação aos biomas segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A Imagem que abre este artigo mostra uma paisagem de savana na rodovia BR-174, próximo à Pacaraima, em Roraima (Foto Comissão de Transporte da ALERR).


Notas

[1] Mucina L. 2019. Biome: evolution of a crucial ecological and biogeographical concept. New Phytol. 222(1): 97–114. https://doi.org/10.1111/nph.15609.

[2] IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 2018. 1° Workshop sobre representação de biomas compatível com a escala 1:250.000: Relatório Técnico. https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101588.pdf.

[3] Brasil. 2004. Decreto nº 5.092, de 21 de maio de 2004. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5092.htm.

[4] Brasil. 2012a. Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm.

[5] Brasil. 2012b. Lei nº 12.727, de 17 de outubro de 2012. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12727.htm.

[6] Brasil. 1953. Lei nº 1.806, de 6 de janeiro de 1953. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/l1806.htm.

[7] Esta série é uma tradução de Carvalho, W.D., S.V. Costa-Neto, F.C.P. Dagosta, P.M. Fearnside, R.R. Hilário, H.F.M. de Oliveira, C.R. da Silva, J.J. de Toledo, B.S. Xavier & K. Mustin. 2025. Amazonian savannas are an integral part of Brazil’s Amazon “biome”: Implications for environmental policies. Discover Conservation 2: art. 12. https://doi.org/10.1007/s44353-025-00031-5[open access]. O WDC foi apoiado por uma bolsa de pós-doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES PNPD e PrInt – Código Financeiro 001). Atualmente, o WDC é apoiado por “Ayudas Maria Zambrano” (CA3/RSUE/2021 − 00197) financiado pelo Ministério das Universidades espanhol. A publicação faz parte do projeto “Ayudas para contratos Ramón y Cajal (RYC) 2023” {RYC2023-045231-I}, financiado por MCIU/AEI/ https://doi.org/10.13039/501100011033 e pela FSE+. PMF agradece ao Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Proc. 311103/2015-4, 406941/2022-0, Fundação de Âmparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM) Proc. 22/07/24 a 22/07/29, e FINEP/Rede CLIMA Proc. 01.13.0353-00. A GC é apoiada pela ‘Ayuda Beatriz Galindo’ (BG22/00121), financiada pelo Ministério das Universidades espanhol e pela Universidade Complutense de Madrid. Agradecemos aos revisores anônimos, e especialmente a José MC da Silva, pelos comentários e sugestões que ajudaram a melhorar este texto.


Sobre os autores

William Douglas Carvalho possui graduado em ciências biológicas e zootecnia e mestrado e doutorado em biologia animal pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Atualmente é pós-doutorando no Centro de Investigação em Biodiversidade e Mudança Global (CIBC-UAM), Universidade Autônoma de Madrid, Madrid, Espanha. Orienta no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade Tropical, Universidade Federal do Amapá, Macapá, Amapá e atua no Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA), Macapá, AP. Pesquisa sobre padrões de diversidade taxonômica, funcional e filogenética de mamíferos ao longo de gradientes ambientais e as respostas de mamíferos quando paisagens naturais e culturais são transformadas em paisagens antrópicas.

Salustiano Vilar Costa-Neto possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Pará, mestrado em Agronomia e Doutorado em Ciências Agrárias pela Universidade Federal Rural da Amazônia. Atualmente é Pesquisador II do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá. Tem experiência na área de Botânica, com ênfase em Taxonomia Vegetal e Ecologia de Comunidades, pesquisando sobre savanas amazônicas, restingas, manguezais, fitossociologia e florística.

Fernando César Paiva Dagosta possui graduação Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Mestrado em Biologia Comparada pela Universidade de São Paulo e Doutorado em Sistemática, Taxonomia Animal e Biodiversidade pelo Museu de Zoologia da USP. Atualmente é professor no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Meio Ambiente da Faculdade de Ciências Biológicas e Ambientais da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Dourados, MS. Ele pesquisa a sistemática e biogeografia de peixes da bacia amazônica.

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências e pesquisador 1A de CNPq. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 800 publicações científicas e mais de 750 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

Renato Richard Hilário possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais, mestrado em Ecologia (Conservação e Manejo da Vida Silvestre) pela Universidade Federal de Minas Gerais e doutorado em Zoologia pela Universidade Federal da Paraíba. Atualmente é professor do curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal do Amapá, Macapá, AP. Pesquisa a ecologia, conservação e comportamento de primatas neotropicais, interação animal-planta, ecologia da paisagem e conservação de mamíferos em paisagens alteradas.

Hernani Fernandes Magalhães de Oliveira possui graduação Ciências Biológicas (Bacharelado e Licenciatura) pela Universidade de Brasília, mestrado em Biologia Animal pela Universidade de Brasília e doutorado em Ecologia pela Universidade de Londres. Atualmente está ligado ao Departamento de Zoologia, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR. Pesquisa biodiversidade e conservação, focado principalmente em mamíferos.

Cláudia Regina da Silva possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Londrina, mestrado em Recursos Florestais pela Universidade de São Paulo e doutorado em Genética, Conservação e Biologia Evolutiva pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-INPA. Atualmente é gerente do projeto Mamíferos do Amapá do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá. Pesquisa Cetáceos na foz do Rio Amazonas.

José Júlio de Toledo possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado de Mato Grosso, mestrado em Ecologia e Conservação da Biodiversidade pela Universidade Federal de Mato Grosso e doutorado em Ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. Atualmente é professor adjunto do Departamento de Meio Ambiente e Desenvolvimento da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Desenvolve pesquisas sobre ecologia florestal, ecologia de savanas e conservação da biodiversidade, com foco em biomassa, carbono, serviços ecossistêmicos, florestas plantadas, diversidade e conservação de espécies de árvores, vertebrados, epífitas e redes de interações entre espécies.

Bruna Silva Xavier possui graduação em Ciências Biológicas – Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestrado em Ecologia e Evolução pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e doutorado em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atualmente é pós-doutoranda na Universidade do Estado do Rio de Janeiro-UERJ. Pesquisa morcegos da Floresta Nacional do Amapá e as consequências da substituição de savanas por plantações nas savanas amazônicas.

Karen Mustin possui graduação em zoologia de Newcastle University, Inglaterra e doutorado em zoologia da Universidade de Aberdeen, Escócia. Atualmente é Pesquisadora Sênior na Universidade Complutense de Madrid, Espanha. Ela é docente permanente no Programa de Pós-graduação em Biodiversidade Tropical da Universidade Federal do Amapá. Ela faz pesquisas sobre as ligações entre governança, equidade social e resultados para biodiversidade em área protegidas relacionadas com a conservação das savanas amazônicas.

As informações apresentadas neste post foram reproduzidas do Site Amazônia Real e são de total responsabilidade do autor.
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