A COP 30 terminou, e com ela foram se revelando limitações e potencialidades da diplomacia contemporânea. O primeiro aspecto de destaque é a importância de realizar a Conferência em uma cidade como Belém. A capital paraense não só reflete a realidade da Amazônia e dos Amazônidas, ou seja, a de conviver com desigualdades sociais à vista e com limitações de infraestrutura que vão muito além da hotelaria, mas também diz muito sobre a realidade de todo o continente latino-americano.
O evento foi um banho de realidade para aqueles que vinham das experiências dos últimos anos em Baku, no Azerbaijão; Dubai, nos Emirados Árabes Unidos; Sharm el Sheik, famoso balneário turístico no Egito; Glasgow, na Escócia; e Madrid, capital espanhola. A Conferência de Lima, em 2014, tinha sido a última por esses lados. Alguns demoraram a entender e outros ainda não entenderam o verdadeiro significado da transição justa. Bastaria andar pelas ruas de Belém.
O segundo aspecto, que se liga ao primeiro, é a possibilidade de a COP30 conviver com manifestações democráticas. A programação da Marcha dos Povos e o posicionamento público dos Munduruku relembram a verdadeira razão de termos nos reunido em Belém: a centralidade das pessoas mais afetadas pela crise climática.
Por último, mas não menos importante, o mundo assistiu ao impulso de agendas concretas de transição energética, adaptação local e justiça social. O debate sobre um mapa do caminho para o abandono dos combustíveis fósseis e a incorporação de perspectivas de gênero e indicadores de adaptação nas políticas urbanas faz da COP30 um marco no posicionamento de países, estados e territórios. Em Belém, a própria Agenda de Ação da conferência enfatizou a necessidade de integrar a perspectiva de gênero em todas as soluções climáticas, como condição para uma “transição justa e inclusiva”.
O texto final da COP 30 frustrou muita gente que, como eu, que acreditava na oportunidade de avanços mais ambiciosos. Porém, logo a estrutura diplomática vigente se impõe para nos lembrar da dissociação entre a realidade e a governança internacional. Metas voluntárias e decisões por consenso foram uma necessidade em 2015, para se ter o Acordo de Paris.
Mas será que esses mecanismos ainda fazem sentido em um contexto em que as contradições entre a economia baseada em combustíveis fósseis e a nova economia de baixo carbono se intensificam? Hoje, esse conflito não apenas opõe passado e futuro, mas afeta diretamente a geração presente, evidenciando que economia e política internacional são dimensões cada vez mais interdependentes.
Um aspecto que merece destaque, ainda que de forma tímida no texto final, foi a participação dos governos subnacionais, especialmente, mas não apenas, os brasileiros. Seja atuando em oposição aos seus governos nacionais, como no caso dos EUA e da Argentina, seja em consonância com as estratégias federais, como no caso do Brasil e seu federalismo climático, esses governos demonstraram capacidade de liderança e inovação.
Exemplos de governança multinível já estão produzindo resultados concretos, como é o caso de Porto Alegre, cujo Plano de Ação Climática desenvolvido com apoio do ICLEI estrutura ações de mitigação e adaptação. No Nordeste, o PLAC Piauí integra clima, desenvolvimento territorial e transição energética justa, enquanto na Amazônia cidades como Barcarena avançam em estratégias de redução de risco e participação comunitária. Esses esforços demonstram que a ação subnacional já move a agenda climática brasileira.
Bancos de desenvolvimento, como a CAF, o BID, o Fonplata e o KFW já entenderam que a implementação da agenda climática passa pelos níveis subnacionais de governo. E mesmo tendo governos nacionais entre os seus acionistas, começam a trabalhar direta ou indiretamente com prefeituras e governos estaduais, via bancos de desenvolvimento subnacionais. Esse movimento tende a se aprofundar, especialmente diante da urgência por investimentos em adaptação e resiliência.
A clareza do vínculo entre as agendas do clima, da biodiversidade e do desenvolvimento sustentável local é vital para a implementação consequente da agenda climática. No ciclo de 2026, em que o Brasil exercerá a Presidência da COP, a esperança é que a diplomacia se renove, e permita que prefeitos e governadores possam ter o reconhecimento que merecem. Isso significa, especialmente, recursos técnicos e financeiros para intensificar e qualificar a sua contribuição para o enfrentamento à crise climática. O ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade, como instituição que representa a constituency de Governos Locais e Autoridades Municipais perante a UNFCCC, não medirá esforços para que essa dinâmica de trabalho multinível seja cada vez mais reconhecida e se torne o padrão mundial. O fortalecimento dessa abordagem é, possivelmente, um dos legados silenciosos mais importantes deixados por Belém.
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