Adis-Abeba, Etiópia – A Semana do Clima da África marcou um ponto de virada: pela primeira vez, comunidades locais ocuparam espaço oficial em um evento mandatado para debater desafios e apresentar soluções. O encontro evidenciou um impasse central da agenda global: como transformar a presença simbólica desses grupos em poder efetivo de decisão?
O encontro “Fortalecendo o Papel das Comunidades Locais no Processo da UNFCCC”, promovido pela Presidência da COP30 em parceria com a Plataforma de Povos Indígenas e Comunidades Locais (LCIPP), reuniu representantes de diferentes regiões do mundo em torno de um mesmo desafio: garantir que vozes locais tenham peso real nas decisões globais sobre o clima. Este momento integra uma agenda de diálogos organizada pela presidência brasileira da COP 30 para ampliar a participação de comunidades locais nas negociações. Depois de Adis Abeba, em 3 de setembro, haverá nova rodada em 13 e 14 de outubro, em Brasília, durante a pré-COP, e outro momento em novembro, em Belém, durante à conferência do clima. A proposta é dar visibilidade às soluções locais e garantir que saberes tradicionais tenham peso real nas decisões globais. Embora comunidades estejam na linha de frente da crise climática, seu reconhecimento formal ainda não se traduz em influência efetiva nos processos internacionais.
Nesse contexto, a LCIPP, criada na COP 21, reafirma sua importância como espaço de intercâmbio de experiências e de disseminação de boas práticas em mitigação e adaptação. Ao promover o diálogo e a valorização de saberes tradicionais, a plataforma vem ampliando o engajamento de comunidades locais nas negociações multilaterais e reforçando o papel estratégico desses grupos na preservação ambiental, na segurança alimentar e hídrica e na construção de resiliência frente aos impactos das mudanças climáticas.
Os relatos apresentados trouxeram à tona a diversidade dos impactos já sentidos: pastoralistas submetidos a deslocamentos forçados pela perda de terras e recursos, comunidades afetadas por eventos extremos cada vez mais intensos, territórios ameaçados pela erosão e povos pressionados pelo desmatamento. Mas o tom não foi apenas de alerta. Foram também compartilhadas práticas comunitárias já em curso, como regeneração de florestas, proteção de nascentes e sistemas locais de alerta, que se mostram como soluções eficazes e capazes de inspirar políticas públicas em escala nacional e internacional, além de fortalecer a governança climática.
Um ponto central da discussão foi a demanda pela presença efetiva nos processos decisórios da UNFCCC. Muitas falas reforçaram a distância entre o discurso e a prática, Sem um espaço qualificado de escuta e de ação, a agenda corre o risco de permanecer distante das realidades mais afetadas pela crise climática. Foram mencionadas a importância da cooperação entre comunidades, governos e sociedade civil, bem como a necessidade de financiamento que chegue à ponta. Joaquim Belo, enviado especial da COP30 para a Sociedade Amazônica e diretor do CNS, reforçou que as soluções climáticas não devem ser impostas de fora, mas construídas a partir das realidades territoriais: a nossa relação com a floresta pode ser parte da solução. Ainda nesse sentido, a plataforma da UNFCCC dedicada a povos indígenas e comunidades locais foi lembrada como avanço, mas que precisa ser fortalecida para garantir que as vozes comunitárias tenham impacto real na definição das metas globais.
“Não queremos ser lembrados apenas quando há desastre. Nossas soluções existem, funcionam e precisam ser vistas como parte da política climática global.” Simon Apalochubakori, de Uganda.
A COP30, em Belém, foi citada como o espaço decisivo para transformar promessas em compromissos concretos. O presidente do Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT), Samuel Caetano, lembrou que as comunidades “não podem depender de intermediários para acessar recursos e que Belém será oportunidade para garantir que a participação comunitária se traduza em resultados tangíveis”.

Os conhecimentos e a resiliência das comunidades locais são estratégicos para o enfrentamento da emergência climática e precisam ser incorporados de forma permanente às políticas.“Sem comunidades locais, não há ação climática eficaz. No Brasil, aprendemos muito sobre isso ouvindo nossos povos indígenas, povos quilombolas e comunidades locais que há séculos cuidam da terra, da água e da floresta”, afirmou a secretária nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Edel Moraes, que representou a Presidência da COP30.
Também esteve presente o secretário de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, Povos de Terreiros e Ciganos do Ministério da Igualdade Racial, Ronaldo dos Santos, que destacou a diversidade cultural como pilar da justiça climática e princípio orientador da COP30.
Este encontro faz parte de uma agenda de diálogos mandatados e oficinas temáticas organizados pela presidência brasileira da COP 30 para ampliar a participação de comunidades locais nos processos internacionais de clima. Depois de Adis Abeba, durante a Climate Week em 3 de setembro, a programação segue com nova rodada prevista para 13 e 14 de outubro, em Brasília, na pré-COP, e culmina em dezembro, em Belém, em paralelo à conferência. Esses espaços de escuta e troca buscam fortalecer a visibilidade das soluções locais e aproximar lideranças comunitárias de formuladores de políticas, assegurando que práticas e conhecimentos tradicionais tenham voz efetiva nas decisões globais.
O evento terminou com um chamado à ação. Os representantes das comunidades presentes deixaram claro que não querem ser vistas apenas como vítimas, mas como agentes essenciais da ação climática global. Suas falas ecoaram a ideia de que proteger territórios, culturas e modos de vida é também proteger o clima do planeta. A Semana de Clima da África consolidou, assim, a percepção de que a luta climática só será eficaz se for inclusiva, reconhecendo que o futuro das negociações internacionais depende do diálogo com quem já vive, no dia a dia, os efeitos das mudanças climáticas
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